Crítica por Jade Abreu.
Com 10 indicações ao Oscar, 1917 tem sido aclamado pela crítica e ganhou o prêmio de melhor filme dramático, melhor diretor e melhor trilha original no Globo de Ouro de 2020. A produção dirigida por Sam Mendes (Beleza Americana e 007-Operação Skyfall) se passa na Primeira Guerra e, considerada uma surpresa por especialistas, desbancou filmes favoritos como O Irlandês, dirigido por Martin Scorsese. Mas afinal o que 1917 tem de especial?
A história é simples: dois jovens soldados recebem a missão de passar uma mensagem a uma outra brigada, para isso precisam passar por território inimigo. Eles têm poucas horas para que, com o recado, a divisão inglesa suspenda ataque aos alemães, que se tratava de uma armadilha planejada há meses. As comunicações foram cortadas (a falta que faz um Whatsapp – fica aí uma sugestão para um segundo nome do filme) e por isso os dois militares são enviados para prestar o serviço.
Blake (Dean-Charles Chapman) é selecionado por ter um irmão que serve ao grupo na emboscada e chama o amigo Schofield (George MacKay). Caso os jovens não consigam, cerca de 1.600 homens serão mortos. Os dois são lance corporal, um dos postos mais baixos no Exército Britânico.
Eles atravessam trincheiras, campos, cidades abandonadas, fazendas largadas, rios e o que houver no caminho com a câmera sempre acompanhando os passos, como se não houvesse cortes. Esse é o grande destaque do filme: é todo feito em um plano sequência – nome da técnica usada em filmagens quando não se nota cortes. São 119 minutos como se fosse uma única tomada. Com a técnica, o espectador não se sente apenas vendo o filme, mas uma testemunha ocular, o que aumenta a tensão ao assistir.
O filme demorou 65 dias em gravação, e logicamente precisou ser cortado para que fosse possível. A complexidade é que, exceto por uma cena de desmaio, quem assiste ao filme não percebe que esses cortes existiram. De acordo com uma entrevista de Sam Mendes para o podcast Behind The Screen, feito pelo The Hollywood Reporter, houve cenas que levaram até 50 takes para que o resultado final fosse atingido.
Trilha sonora dá ritmo ao filme
Conversas bobas, como fofocas de quartel, são usadas para preencher o que poderia ser um vazio no roteiro e causam alívios cômicos dentro das cenas. Afinal o filme se passa em praticamente um dia corrido. Se não houvesse esses diálogos a tendência seria de ser cansativo. A trilha sonora, pelo mesmo motivo, tem um papel importantíssimo no desenvolvimento da trama, já que ela é a responsável por acentuar ainda mais uma agonia em momentos de guerra e fechar as lacunas para quem busca som em tela. Cenas sem falas são, então, preenchidas por melodias que deixam o espectador desperto e ansioso nas batalhas.
O filme é emocionante, admito ter chorado em duas cenas particulares quando assisti, mas também confesso que sou “manteiga derretida”. Sendo uma pessoa mais sensível ou não, a forma como é filmado envolve e causa comoção. É importante ter em mente que o que deixa a trama emocionante é a direção, porque o roteiro em si é fraco e até meio chato.
Como filmes de guerra tentam fazer, o lado que conta a história é o de um herói íntegro e corajoso que luta contra inimigos desleais. Em 1917, essa abordagem simplista não é diferente. Ao ver um soldado alemão ferido, os jovens e “bons” homens ingleses pegam água e o ajudam a sair de um avião em chamas. Enfim, qualquer um familiarizado com o comportamento britânico em guerras (como colonização nas Américas, o massacre na independência da República da Irlanda, a separação racial na África do Sul, a divisão de castas na Índia e a Guerra do Ópio na China) tende a considerar, no mínimo, um certo exagero o comportamento ético dos protagonistas. Também é “impressionante” a habilidade dos dois de desviar de balas.
De toda forma, o filme é para ser uma homenagem ao avô do diretor e co-roteirista Sam Mendes, que tinha a missão de ser mensageiro na guerra. Principalmente pelo tamanho que tinha (aproximadamente 1,64 centímetros), ele conseguia viajar disfarçado sem ser visto.
1,5 km de trincheira construída
Embora o espectador deva ficar com a pulga atrás da orelha para os comportamentos dos heróis, o filme é fidedigno às trincheiras, podendo ser usado até em salas de aulas para mostrar como as proteções eram e como as pessoas viviam naqueles territórios. Sobre esse ponto, a produção ainda mostra a diferença das barricadas do exército alemão e do britânico, o que mostra uma arquitetura e lógica militar diferenciada em cada uma.
A produção do filme é impecável, as armas, as roupas, a paisagem escolhida. Responsável pelo desenho de produção do filme, Dennis Gassner disse em entrevista ao site Fortune que foi construída uma trincheira de 5,2 mil pés, o equivalente a 1,5 quilômetro. Para abri-la, ele estudou por volta de 50 mil imagens de arquivo que mostrassem o funcionamento e como os soldados viviam naquelas barreiras.
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