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Jogador Nº 1 (Ready Player One – 2018)

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A evolução da computação gráfica é algo que intriga muita gente, e a barreira entre o real e o “criado por computador” diminui a cada dia. A maneira mais fácil de enxergar as mudanças gráficas é pelos videogames.

Precisamente em 2004, no lançamento de um jogo de futebol para o Playstation 2, as pessoas ficaram boquiabertas com a forte semelhança do Ronaldinho Gaúcho da tela com a vida real. Anos depois, com o lançamento de L.A Noire para Playstation 3,  houve outra evolução: a captura de movimento e sincronia labial beirando a perfeição. Atualmente, alguns games como o prodígio Detroit, para Playstation 4, podem até ser confundidos com a realidade, em alguns momentos (baseado no trailer).

O cinema também sempre acompanhou todas essas passagens e conseguiu, a cada novo período, apresentar recursos gráficos em que o “falso” se tornava o real, e ninguém conseguiria dizer que tal efeito em tela não foi realmente filmado. Compare Escorpião Rei com Os Vingadores e você verá a evolução. Agora, aparece Jogador Nº 1 com uma premissa técnica bem interessante: mesclar propositalmente o real com o gráfico mais a captura de movimento. Será que, em algum momento, o cinema vai conseguir dispensar os atores? Ou talvez eles só sirvam para doar o corpo e voz, e a atuação e questões dramáticas fiquem nas mãos do diretor? Não sabemos, mas desde que seja bem feito, quaisquer novas experiências são bem-vindas.

Jogador Nº 1 é um filme “já rodado” no uso de grandes efeitos visuais do Steven Spielberg (Tubarão). Parzival (Tye Sheridan) vive numa favela no município de Columbus, Ohio, no ano de 2044, quando as pessoas não se importam mais com o mundo real e passam a maior parte do tempo em um game de realidade virtual chamado Oasis. No jogo, existe um desafio que o criador Halliday (Mark Rylance) introduziu antes de morrer. Ao ser completado, o campeão ganha autonomia total sob esse mundo virtual, podendo escolher o que fazer em seguida. Um dia, o protagonista está em mais uma tentativa de completar a primeira fase desse desafio e cruza com Art3mis (Olivia Cook), uma jogadora conhecida que também tem motivos pessoais para se tornar a campeã.

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Com cinco minutos de filme, a crítica contida na obra fica exposta. Conforme o tempo passa, as pessoas tendem a dar mais importância para o virtual do que para o real, até chegar a um ponto que nada mais na Terra importa, e elas passam a viver uma segunda vida que, embora tenha extrema semelhança com a realidade, há margens para serem o que bem entenderem e fazer o que quiserem, sem se importar com o julgamento alheio. As pessoas ficam mais fortes psicologicamente.

Sim, temos uma premissa super atual, porém extremamente batida, o que poderia ser relevado se o filme abrisse mais espaços para esse debate. É possível, de fato, perceber tudo que foi citado no início do parágrafo anterior. Mas essa é a questão: é apenas uma percepção, o próprio conflito principal da trama nem sequer é construído em cima disso.

Em determinados momentos, suspeitamos que o filme vai colocar em discussão por que os seres humanos dão mais atenção para o cibernético, a solução para isso ou, pelo menos, as consequências que isso pode gerar. Não! Nada disso é abordado. Até fica subentendido que o desafio criado por Halliday antes de morrer realmente foi no intuito de que alguém conseguisse fechar aquele jogo um dia, mas são apenas indícios, um pano de fundo enquanto acontecimentos que parecem de um road movie se destacam mais na tela. Um exemplo é justamente o terceiro ato do filme,, em que as cenas são tão longas e grandiosas em termos de batalha e CGI (computação gráfica) que você já não lembra mais de nenhuma crítica e, por algumas ocorrências, a motivação do herói parece perder totalmente o peso narrativo.

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Peso narrativo das motivações, outro ponto a ser avaliado, os primeiros minutos indicam que Parzival tem esse desejo de ser o dono do Oasis para ganhar dinheiro e tirar a própria família da berlinda. Entretanto, o pouco tempo em tela e os diálogos malfeitos da família do personagem fazem com que o espectador não se importe com tal motivação, ao mesmo tempo que o filme também transparece não se ligar mais.

Art3mis, então, tem a motivação completamente negligenciada. Há uma cena de extrema ira da personagem com Parzival, em que ela indica algo grave no próprio passado que a levou a querer entrar nessa guerra. A verdade é que a produção acaba e nada sobre a personagem é explorado. O final dela chega a remover toda noção de girl power que é construída ao longo da trama.

No aspecto visual, Jogador Nº 1 consegue impressionar pela paleta de cores que passam por tons acinzentados, principalmente enquanto o filme está em live action, até em tonalidades bem contrastantes, enquanto está em CGI. Os efeitos gráficos são muito bem feitos e exibem um desenho 3D com ténicas de última geração e capturas de movimento excelentes. E em termos de montagem, a migração do real para a computação é inteligente e imperceptível em alguns momentos, isso por conta da solução de que o enredo nunca precisa que haja uma mistura, ou que as duas estéticas entrem em conflito. Entretanto, o 3D é completamente dispensável e patético.

banner do filme

A trilha sonora é excelente, com algumas músicas originais e instrumentais que possuem uma sonoridade de um game de RPG e aventura. Existem vezes em que os personagens se comunicam um com o outro e fica evidente a música de fundo, mas não chega a ser alta a ponto de atrapalhar o diálogo. As músicas existentes não feitas para o filme também combinam muito com os momentos de cada personagem. O filme já começa com uma música famosa e, por vezes, canções usadas em outras produções de romance e comédia tocam, já causando aquela familiaridade para com o público. Encaixa.

Jogador Nº 1 consegue até mesmo trazer questionamentos em relação ao uso da computação gráfica no cinema, e nos faz pensar como pode ser o futuro dessa mídia. Talvez essa seja a maior reflexão pela parte técnica agradar muito. Porém, em termos de enredo, o filme se mostra frágil, sem poder de decisão para que lado seguir. Ele aborda uma série de motivações que são esquecidas e tem um tempo de duração maior do que deveria. É divertido por conta da técnica, algumas piadas e química (única e exclusivamente do casal protagonista), mas nem um pouco interessante no quesito história.

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