Filmes como este O 3º Andar são padrões no circuito comercial de horror. Certas estéticas e estilos não podiam ser feitos fora dos Estados Unidos, devido a dificuldades técnicas variadas. Com o avanço da tecnologia, é mais fácil que algo como esta produção seja feita na Espanha, por exemplo.
O 3º Andar se parece tanto com o estilo terror dos Estados Unidos que é fácil ver referências de todo tipo na história da família que se muda do interior para Madri, na década de 1970, em busca de perspectivas novas. O que eles não sabem é que uma senhora idosa morreu no apartamento que ainda estão pagando.
Tem de tudo aqui. Crianças inocentes que se deixam interagir com o espírito por ingenuidade, idosos com alguma debilidade mental que são os únicos que enxergam o fantasma, a adolescente que fica sozinha em casa e é desacreditada pelos pais, o rapaz que flerta com uma garota misteriosa sem saber que ela quer assombrá-lo.
Trata-se, em estilo e em trama, de um terror sobre uma família em uma casa assombrada. Com algumas diferenças fundamentais. Primeiro porque, por se passar na Espanha naquele período, O 3º Andar envolve um contexto cultural e político único, que é comentado pela situação dos personagens. O pai gastou todas as economias para dar entrada no apartamento e, agora, eles precisam se unir para pagar o resto do financiamento.
O andar dos sustos
Mas isso é natural apenas com a mudança de país. O que leva à outra diferença fundamental: assim como no cinema americano de assombração em uma casa ou apartamento, O 3º Andar tenta criar horror por meio de sustos. Ao contrário, porém, abusa do recurso.
Talvez porque o diretor Albert Pintó acredite que sustos são divertidos, ou porque ele pense em pegar mais pesado por estar fora dos Estados Unidos. De um jeito ou de outro, ele não se segura em tentar assustar o espectador em toda cena de O 3º Andar. Mesmo nas cenas que não são de terror. Mais de uma vez por cena, em algumas ocasiões.
O método é padrão, movimentos de câmera criam expectativa de algo que vai entrar no enquadramento. Com a atenção capturada, ele faz com que o fantasma apronte alguma coisa com um aumento súbito do volume. Em certo momento, a personagem da filha (Begoña Vargas) está na rua, longe do prédio, em um telefone público. E uma pessoa que espera a vez de usar o aparelho dá um tapa na parede para pedir que ela termine logo.
Apenas para manter o clima constante de susto, o tapa é feito com uma mixagem de som muito mais alta que a mixagem da cena tinha até então. Para o espectador que acha divertido levar susto, é um prato cheio. Para que gosta de terror com tensão, é cansativo. Especialmente porque O 3º Andar tem tanto sustos, que vira lugar comum, para de funcionar e atrapalha o ritmo das cenas de terror.
Uma das mais inspiradas envolve um reflexo da fantasma em uma televisão. Quando o personagem vira para olhar atrás de si, não vê nada. Suspense criado. Mas Pintó precisa dar um grande susto, o que libera a tensão toda de uma vez. Na continuidade da cena, o espectador está mais aliviado do susto que com medo da aparição.
A discussão política no 3º andar
Quem gosta de filmes de terror deve estar acostumado a fazer piada com personagens em situações como a família de O 3º Andar. “Se eu visse algo do tipo na minha casa, eu mudava no outro dia”. É justamente nesse contexto que a produção fica mais interessante. A família inteira descobre a assombração e sai de casa para fugir.
É onde entra o contexto social de O 3º Andar. O apartamento já está financiado e é uma divida que eles precisam pagar por anos. O que significa que eles não podem vender e não podem pagar para ficar em outro lugar. Eles estão presos social e financeiramente ao imóvel e, por consequência, ao fantasma.
O contexto terá mais peso para quem conhecer a situação da Espanha naquela época, mas evoca a sensação de um terror único. O medo de não ter onde viver, de não ter emprego, de não ter dinheiro, de ser julgado pelos outros.
Há também, uma discussão muito interessante sobre LGBTfobia e famílias “tradicionais”. Mas isso só aparece nos últimos minutos de filme e, infelizmente, não conduz a uma conclusão que dê peso à discussão. Ainda assim, usa de um clichê para tornar o espírito do apartamento muito mais rico que o padrão.
Apuro técnico
Em termos técnicos, O 3º Andar não deve em nada a produções grandes dos Estados Unidos. A direção de fotografia de algumas tomadas impressiona pelo detalhamento. Desde a composição com membros da família em primeiro plano mais iluminados, e a casa em segundo com sombras nas paredes e nos móveis.
Também típico dos Estados Unidos é o uso de lentes de grandes ângulos, que tornam o longo corredor que liga todo o apartamento em um espaço gigantesco. O que dá a percepção que uma corrida para fugir de algo seja maior, ou que há mais lugares secretos de onde algo possa pular para assombrar os personagens.
A direção de arte acompanha o perfeccionismo, com um apartamento com tons pastéis e móveis escuros que facilitam as sombras. Há até um quadro que muda de posição entre os takes. Os figurinos seguem o estilo, com tonalidades mais baixas até em cores mais fortes. A maquiagem deforma a idosa que assombra o imóvel e se destaca nas reações dos personagens, que ficam com manchas vermelhas de quem está traumatizado com algo que acabou de ver.
Com tanto apuro e esmero técnico, é uma pena que O 3º Andar se foque tanto em sustos. Com mais destaque para ambientação e mais tempo para as questões sociais e políticas, talvez se tornasse algo comparável às grandes produções do gênero. Do jeito que é, deve garantir muitos sustos que serão esquecidos assim que a projeção acabar.
O 3º Andar – Terror na Rua Malasaña
Prós
- Aspectos técnicos impressionam
- História com rápidas discussões sociais
Contras
- Confia demais em sustos
- Os temas centrais são pouco explorados