Avanti Popolo é um filme difícil. Um dos mais difíceis da minha vida. É a prova definitiva de que uma duração curta não é sinônimo de um filme rápido. Planos exaustivamente longos, narrativa sugerida através de cortes sutis e diálogos que refletem a dificuldade da comunicação dos personagens. Se em termos de linguagem é eficiente, em termos de ritmo é extremamente complicado.
Homem volta para visitar o pai para garimpar informações e documentos do passado da família. A sinopse é simples, assim como, em grande parte, sua representação. Os dois personagens são chamados de Pai e Filho, outro é Taxista e por aí vai. A grande representação vem por trás do que é buscado por baixo da montanha de antiguidades da casa.
O filme abre com um carro passeando por uma cidade. São minutos disso, de onde se tiram algumas coisas. Um, pelas placas e pelos carros, sabe-se que o período da trama é atual. Pela transição do céu, que está anoitecendo. Ao final, o carro é obrigado a diminuir a velocidade por conta de um homem distraído. Simples e lentamente, o personagem do Filho é apresentado. Ele está divagando sem rumo na vida, alheio ao que acontece no mundo ao seu redor, mesmo que essa presença do mundo seja um carro que pode lhe atropelar.
Quando ele encontra o pai ao chegar em casa, o diálogo dos dois é complexo. O pai só fala que não tem lugar nos quartos e que o filho vai ter que dormir na sala. Daí em diante, tudo sobre o que ele fala é a sua cachorrinha. Enquanto isso, o Filho fica falando sobre a casa e o passado da família. Os diálogos seguem caminhos opostos para cada personagem. Os dois estão juntos em cena, conversando ao mesmo tempo sobre assuntos diferentes. O pai, preso a um elemento micro de seu presente, o filho do passado. Os dois estão próximos, mas são afastados.
À medida em que o filho desvenda os arquivos do passado, vai-se compreendendo que se trata da vida de um dos membros da família em específico. Em plena ditadura, a pessoa foi para a Rússia para seguir carreira acadêmica. As imagens que revelam isso surgem na forma de arquivos de Super 8. A película foi convertida para o digital e ampliada para a resolução da câmera digital com a qual o filme foi filmado. O contraste só é sentido na definição, mas a fotografia dura e a direção de arte que enche os cenários da casa com defeitos faz com que as imagens pareçam entre o limite das câmeras amadoras e a iluminação profissional. Esse recurso é utilizado porque as filmagens em Super 8 são reais. De uma família real. Ou seja, o filme existe no limiar entre a ficção e o documentário, uma vez que os personagens estão descobrindo uma história real.
O que mais chamou a atenção é a forma com a qual a casa é filmada. Não importa o cômodo ou a abertura da lente, o imóvel é filmado sempre de um ângulo específico. Do portão para dentro. Os quadros podem ser mais abertos ou mais fechados, mas sempre serão com a frente da câmera voltada para o sentido contrário ao da entrada. O efeito parece tolo, mas no final existe uma inversão, quando se revela uma imagem que poderia, até certo nível, refletir a visão do que a câmera estava representando desde o começo, indicando qual o papel do espectador na história.
Casa representada sempre pelos mesmos ângulos, mesmo que em locais diferentes.
Os problemas do filme existem em dois níveis. Primeiro por conta dos planos longos. Depois de cenas extremamente compridas com aquelas duas pessoas que mal se comunicam interagindo pouco, o filme fica muito cansativo. O segundo por conta da proposta do filme. O que o Filho está realmente pesquisando entre as quinquilharias do Pai não é completamente compreensível apenas assistindo ao filme. É preciso haver uma pesquisa após a sessão para entender a produção em sua totalidade. E como o ritmo é tão lento, é difícil despertar o interesse do espectador para buscar essas informações. Ainda assim, mesmo que despertasse, não é apropriado para um filme não revelar a totalidade de sua história apenas em sua extensão.
Vale a pena ressaltar a presença da cadela Baleia, cuidada pelo personagem do Pai. O nome é uma referência à cachorra icônica de Vidas Secas. Se lá o animal era uma representação quase humana das consequências da miséria extrema, aqui ela representa a perda daquelas pessoas para um mundo que as deixou à deriva. Tanto o é que ela se perde. Sem motivo, apenas porque é o que acontece normalmente na vida. E assim, como a vida, Avanti Popolo passa lentamente e não atrai o espectador não atento aos seus pequenos momentos que o enriquecem.
ALLONS-YYYYYYYYYYY…