Assim que a Mari me viu pela primeira vez, ficou envergonhada. Imagino a situação dela. Ir ao shopping com a mãe para assistir Como Treinar o seu Dragão 2 e de repente ela apresenta esse cara gordo e barbudo ao lado da namorada. Quem são essas pessoas? Mari se escondeu atrás da mãe e ficou em silêncio enquanto eu contava para ela que sou o culpado por ela assistir pelo menos um desenho por semana.
Após algum tempo ela perdeu a vergonha e passou a conversar conosco. Inclusive ganhou um interesse especial por fingir que cortava minha barba. A pergunta foi besta, é claro, mas tive que fazê-la. “Mari, você está empolgada com o filme?” A resposta veio na forma de dois olhos esbugalhados de animação e um rosto subindo e descendo em tom de afirmação. Foi tudo o que ela me falou sobre o filme antes da sessão.
Entramos no cinema, quando a sessão estava para começar, ela fez uma visita rápida ao banheiro. De volta ao lugar, ficou atenta quando as luzes apagaram, a tela iluminou-se lentamente e o som iniciou um pequeno ruído indicando que estava sendo ligado.
O primeiro sinal de como o 3D tinha efeito sobre Mari foi na abertura da Dreamworks, quando o anzol do menino na lua salta da tela. A pequena garota ao meu lado se assustou e tentou se desviar levemente. Foi apenas uma demonstração pequena do que viria a seguir. O filme começa com uma cena super acelerada, revelando uma corrida alucinante de dragões com direito aos répteis alados saindo e entrando na tela em cortes rápidos. O 3D dá constantemente a impressão de que eles e suas rajadas de fogo estavam para pular sobre os espectadores. E isso foi bem mais impressionante para Mari que um anzol mixuruca.
Menos de cinco minutos de filme e ela já estava agarrada ao braço da mãe, que tentava acalmá-la. Pouco depois ela estava no colo, protegida pelo abraço materno. Dez minutos mais e ela já estava calma novamente em seu lugar. O efeito estereoscópico já não a assustava mais e pelo resto da projeção, Mari assistiu ao filme quietinha, desviando a atenção raramente. Pelo transe em seu olhar, era bem claro que estava completamente envolvida com a história sendo contada diante de si.
Terminada a sessão, ela garantiu uma cópia das três máscaras que estavam sendo distribuídas fora do cinema. Perguntei-lhe de qual dos personagens gostou mais. Ela respondeu pegando as máscaras. A primeira era do dragão, Banguela, que tirou da pilha e segurou entre as pernas. A segunda, do protagonista Soluço, seguiu o caminho da anterior. Ela segurou a terceira e a esticou na minha direção. Nela estava estampado o rosto da mocinha, Astrid.
Astrid e Soluço. Relações que marcam.
A outra pergunta foi sobre a cena favorita. Ela respondeu novamente com as máscaras. Pegou duas delas e juntou num beijo, remetendo ao momento entre os dois personagens no filme. Depois citou algumas das conquistas de Astrid na trama e fechou detalhando um pouco melhor outra situação. Dizer qual e como seria dar um spoiler do filme. Mas as respostas dela me fizeram pensar um pouco.
Astrid é uma personagem maravilhosa. Ela é uma mulher, termo adequado porque agora a personagem é maior de idade, forte, decidida, inteligente e carinhosa. Que exemplo feminino melhor para uma uma menininha seguir? Depois dizer que as conquistas dessa mesma personagem estavam dentre as partes favoritas de Mari foi a deixa para compreender que, talvez, a personagem tenha tido uma influência extremamente positiva sobre a visão de Mari do mundo.
A união vale mais que a diversão pura e simples.
O legal foi a outra cena que ela disse ter gostado. Apesar de não poder descrevê-la, gosto que ela se trate não de ação mirabolantes, efeitos coloridos ou qualquer outro chamativo visual. A cena falava sobre união, um dos temas principais do filme. Gosto da ideia de que a preocupação pela relação positiva entre as pessoas é mais interessante que todas essas coisas tão comuns em filmes infantis. E o fato de que uma criança como a Mari possa perceber isso, mesmo tendo se recusado a falar as lições que tirou da produção, pra mim é apenas representação de que não devemos perder a fé nas pessoas.
FANTASTIC…