Diferentes culturas geram diferentes estilos na linguagem de cinema. Apenas o Brasil faz filmes de “favela” como ocorre por aqui. Apenas os Estados Unidos brincam com contextos absurdos em escalas grandiosas. E só a Coreia do Sul consegue fazer melodramas temperados com violência estilizada. Para quem gosta, este A Vilã é um prato cheio.
Não falta tragédia na história de Sook-hee (Ok-bin Kim). Depois de massacrar sozinha uma gangue, ela é presa e levada para o esconderijo secreto de uma agência de assassinos. Lá, é treinada para se misturar à população enquanto mata alvos designados. O passado secreto, porém, vai atrapalhar as chances de conseguir uma nova vida.
Só pela sinopse fica clara uma diferença em relação a outros filmes de estilo do país asiático. Ao contrário da belíssima trilogia da vingança do diretor Chan-wook Park (um dos melhores exemplos de produção da Coreia do Sul), não se trata de uma trama sobre uma pessoa em busca de algo, mas de conspirações de organizações com uma personagem que serve de peão perdida no meio.
Para fazer com que o espectador compreenda toda a trama, a narrativa vai do treinamento e eventual trabalho de Sook-hee para flashbacks que explicam como ela foi parar no massacre que efetuou. À medida em que as reviravoltas se somam, mais exagerado e confuso parece.
Numa hora ela teve o pai assassinado brutalmente diante de si e na outra se apaixona pelo homem que a adotou. Enquanto isso, se descobre que o novo amor está envolvido com alguma organização. A relação entre a gangue, a agência e essa tal organização nunca é explicada. Pessoas são mortas aqui e ali sem razão. E no meio disso, Sook-hee também mata sem saber por quê.
Essa falta de agência dela na trama enquanto as desgraças se somam revelam uma falta de personalidade. Ela só age para sobreviver e se vingar, mas não gosta de nada, não fala nada. Quando, em certo ponto, o filme sugere que ela está chateada por ter perdido uma amiga, não dava para acreditar que elas tinham algum tipo de relação.
Se o melodrama não funciona, pode contar com a violência estilizada em cenas de ação que simulam planos sem corte. O diretor Byung-gil Jung usa dos truques inventados por Alfred Hitchcock em Festim Diabólico para fazer com que os cortes sejam “invisíveis”. Entre aspas porque qualquer um que entenda um pouco de filmagem saberá que cada passagem de câmera pelas costas de alguém é uma transição.
Especialmente quando Jung parece esquecer de fazer a transição entre zooms. Então, às vezes, a câmera passa por trás dos cabelos de Sook-hee e sai com de uma grande angular para uma lente fechada. Então essa simulação de plano sem cortes é perdida. Mas o estilo funciona para gerar o efeito desejado. Entre os golpes fatais, sangue jorra de feridas de maneira irreal, o que contribui para que a violência exagerada não seja tão verossímil a ponto de causar incômodo no espectador. Ela é quase cartunesca, o que a torna suportável.
Mas o efeito tem seus problemas. Como a personagem não tem personalidade, em certo ponto fica difícil torcer por ela. Ainda mais depois que ela mostrou ser capaz de matar umas cem pessoas no começo, antes de um treinamento especializado. Ela nunca parece estar em perigo de verdade.
Em uma cena especial, o estilo sem cortes é usado para uma luta de espadas em motos. Não apenas parece que a protagonista não está em perigo, como o uso de veículos faz com que a câmera trema demais e não seja possível ver o que está acontecendo.
No fim, soa como uma grande barulheira. A reviravolta final até surpreende, mas é tão inflada com o melodrama que parece exagerada. E como o espectador não se importa tanto com a heroína, a surpresa não ressoa. Cansa cedo demais para um filme de 129 minutos.