Essas dez pessoas da imagem acima constituem o elenco principal de Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindewald. Sim, são dez personagens com conflitos desenvolvidos em começo, meio e fim em um filme de pouco mais de duas horas. Na continuação da retomada de uma das maiores franquias cinematográficas. Parece confuso?
Seis meses após o primeiro filme, Grindelwald (Johnny Depp) foge da prisão quando é transferido. Ciente que o antigo amigo e agora inimigo vai para a França para encontrar Credence (Ezra Miller), Dumbledore (Jude Law) pede para que Newt Scamander (Eddie Redmayne) visite o país e encontre o garoto antes. Lá, eles encontram outras pessoas em busca do menino poderoso.
Já na sinopse ficam claros dois dos maiores problemas desta produção: o fato de que o protagonista Scamander não tem ação dentro da narrativa, e que a roteirista J. K. Rowling está mais interessada em contar algo além dos eventos do filme. E é fácil notar como esses dois problemas são previsíveis quando se fala do décimo produto da franquia Harry Potter nos cinemas.
De forma bem simples, Os Crimes de Grindewald é uma peça de uma história. O que não necessariamente é negativo. Rowling tem noção de que o filme deve funcionar individualmente e faz um excelente trabalho ao criar uma condução que leva a um clímax eficiente. Tudo na história serve ao terceiro ato, desde as tramas paralelas, com todas as mil e uma reviravoltas, até uma conspiração relacionada diretamente aos verdadeiros protagonistas dessa nova franquia, chamada de Animais Fantásticos.
O que requer também uma mão eficiente de David Yates, o diretor. Já veterano do universo de magia (este é o sexto filme da série que ele conduz), ele sabe fazer com que o ritmo da ação e da montagem acelere até o grande conflito final, quando toda a conspiração criada por Rowling é revelada de maneira bombástica, o que funciona para atiçar o fã fervoroso de Harry Potter.
Por outro lado, para aqueles que não conhecem nada da saga, muitos dos eventos do filme passam quase desapercebidos. Isso porque, todo mundo está conectado. É incrível que uma história que se desenrole por três países tenha peso emocional para um grupo de pessoas conhecidos. É como se o mundo inteiro girasse ao redor de quatro ou cinco pessoas num fluxo de coincidências estapafúrdias.
Especialmente Newt, Tina (Katherine Waterstone), Queenie (Alison Sudol) e Jacob Kowalski (Dan Fogler). Se o quarteto era a alma e o coração do primeiro Animais Fantásticos, eles não passam de coadjuvantes neste. Porque, como o filme precisa dar andamento ao grande conflito que deve ocorrer na quinta parte, sobra pouco espaço para eles. E esse pouco espaço é utilizado em algumas das cenas mais mal escritas do longa.
Tina e Newt, supostamente o par romântico principal da nova franquia, têm poucas cenas juntos. E apenas uma fora de ação, quando eles discutem um desentendimento tão bobo que parece algo criado por uma criança. Já o outro casal, Queenie e Kowalski, tem um ciclo muito mais interessante, com direito a um final surpreendente que reflete a maior qualidade do filme: o discurso do vilão.
Ao contrário de Voldemort, um monstro criado da falta de amor, Grindewald fala sobre empatia. Ele não quer matar por ódio puro e aberto, mas por uma racionalização dele. Ele é carismático e o que prega realmente toca o coração daqueles que o escutam. Um retrato de como o preconceito pode se vestir de coisas belas para ter a liberdade se agredir. O que também faz com que a maldade dele seja mais perversa.
Yates e Rowling garantem um espetáculo digno do que se espera da franquia. Os efeitos especiais fazem com que tudo pareça real, desde o animal mágico mais grandioso até um truque pequeno de varinha. Mas além disso, é como eles usam a tecnologia.
O mundo de Animais Fantásticos é coerente dentro de uma iluminação soturna típica de Harry Potter, e mistura o extraordinário da magia com coisas banais, como uma sessão em um ministério em que estantes vitorianas se movem sozinhas. O que também é belo visualmente.
Infelizmente, o filme sofre do mesmo mal de inúmeras adaptações para o cinema, ele não se sustenta sozinho. Para ter um mínimo de compreensão do que acontece é preciso ter visto o primeiro. Para compreender todas as tramas, é preciso ter visto todos os Harry Potter. Para pegar detalhes até, é preciso ter lido os livros.
Nesse sentido, chega até a ser bobo como Rowling e Yates parecem piscar para os fãs com as inúmeras referências gratuitas a cada um dos oito filmes do bruxo com cicatriz na testa. Para uma produção que se permite discutir temas mais adultos, a ingenuidade dos realizadores incomoda. No entanto, ainda é um espetáculo divertido e que prende. Principalmente para quem entender tudo o que acontece na tela.