Este Ao Cair da Noite é um filme que chega com muitas expectativas indiretamente relacionadas a ele. É da A24, a mesma produtora de A Bruxa. É uma obra de ficção científica pós apocalíptica com alguma infecção que está acabando com a humanidade. E também é a nova produção com o ator, diretor e produtor Joel Edgerton. Mas o resultado final é isso tudo – e nada disso ao mesmo tempo.
De certa forma é um horror silencioso e construído em cima da ambientação, como em A Bruxa. Também é uma ficção científica com infecção biológica e tem o Edgerton, que mais uma vez faz um homem bruto com muita humanidade. Ele é Paul, um pai de família que aprendeu a sobreviver em uma casa no meio da floresta, com o filho Travis (Kelvin Harrison Jr.) e a esposa Sarah (Carmen Ejogo), enquanto algum tipo de doença contagiosa destruiu a civilização. Tudo muda quando eles conhecem o estranho Will (Christopher Abbott), que muda a rotina de todos.
Em grande parte, Ao Cair da Noite é um filme de horror sobre perigo biológico com pessoas brutas em um ambiente muito bem trabalhado. Mas também é um filme intimista sobre as fragilidades da vida em sociedade.
É onde entra a importância do personagem Travis, o verdadeiro protagonista do filme. Com 17 anos, toda a produção é contada do ponto de vista dele. Isso se dá porque ele serve para dois contextos. Primeiro, por ser alguém inocente em um mundo horrível; depois, por ter certas necessidades e expectativas típicas da idade.
Porque, quando ele conhece a esposa de Will e tem pela primeira vez a presença de uma mulher que não é a mãe dele, ele começa a ter reações típicas da idade. O que gera constrangimento e momentos engraçadinhos. Mas, também, num mundo sem esperança, pode causar tensão. Como confiar na pessoa que mora na casa ao lado? Como lidar com atração por uma desconhecida que tem uma alta dose de segurança pessoal e de potencialidades?
Quanto a Travis ser inocente em um mundo horrível, é onde o roteirista e diretor Trey Edward Shults quer realmente chegar. Porque Paul e Sarah estão preparados para fazer qualquer coisa para sobreviver, o que inclui matar friamente e abandonar pequenas confianças que pessoas têm em desconhecidos numa vida em sociedade. Enquanto o filho está disposto a acreditar, o que vai ser construído até o clímax e a reflexão final do filme.
No caminho, cenas tensas criadas com base no não ver. Quando os personagens correm para a mata, a câmera mostra as árvores, mas o espectador não consegue ver tudo por conta da disposição delas. Da mesma forma, dentro da casa, os cômodos são completamente escuros e são gradativamente iluminados pelas lâmpadas de Travis quando ele se move. E Shults sabiamente faz com que os takes comecem no escuro, durem a passagem da ação e terminem novamente nas trevas.
Essa tensão constante, também construída por uma trilha musical de cordas com notas que tocam por muito tempo, gera esse medo que todos sentem na vida real. Todas as vezes que se cruza com um vizinho no corredor do prédio ou no elevador. É uma intimidade momentânea forçada entre estranhos, mas que todos aceitam porque deve-se esperar o melhor.
O elenco principal, de praticamente seis pessoas, é primoroso. Edgerton mantém-se bom como o bronco humano. Carmen Ejogo segue a premissa do colega de elenco, como uma mulher que sofre com as coisas horríveis que tem que fazer. Christopher Abbott transparece uma inteligência no olhar que permite compreender o que Will pensa mesmo quando ele não fala. Mas o destaque é Harrison Jr., que é o foco humano da trama. É preciso sentir os medos e esperanças do personagem por meio dele, e o garoto dá conta do recado.
Trata-se de um filme de ritmo lento, mas não sem ritmo. Capaz de conduzir por meio da expectativa de ver a ação tradicional de filmes de gênero, mas muito dele é contado por cenas que não são vistas. Tanto é que muitas coisas que fazem com que o enredo se mova não acontecem na tela. Pode ser negativo para quem gosta que tudo seja explicado, assim como pode ser positivo para quem busca certas sutilezas em menor ou maior grau.