Mais um filme adaptado de videogames. Mais uma tentativa de quebrar com um estereótipo bobo. O famoso clichê de que esse “subgênero” só gera produções ruins cria uma expectativa que é tão negativa que ataca até os realizadores. Neste caso, o ator Michael Fassbender, que estreia como produtor, entrou com a intenção de fazer uma boa obra de ação… E só.
Mesmo com um enredo tão complexo quanto o da franquia Assassin’s Creed, cujas histórias sempre seguem três linhas paralelas e já se espalharam por nove jogos principais, vários secundários, livros e histórias em quadrinhos. Todos parte do mesmo universo. É onde entra a trama principal da série. Existe um mistério maior que move a marca e o filme precisa acrescentar em cima dele.
Ao mesmo tempo, é preciso contar a história do novo protagonista, Callum Lynch (Fassbender), que será executado como assassino. Depois da injeção letal fazer efeito, ele acorda dentro do complexo da empresa Abstergo. Por meio de uma máquina chamada Animus, eles poderão recuperar as lembranças de um ancestral de Lynch que viveu na inquisição espanhola e tem o segredo para um artefato que pode mudar o mundo. O antepassado, chamado Aguilar (também vivido por Fassbender), faz parte de um grupo chamado assassinos, que tenta salvar um príncipe das mãos dos templários.
Com tanta história, é incompreensível como o produtor se focou apenas na ação. É justamente onde está o maior defeito do filme. Tem material de sobra na produção para ter algum aprofundamento, seja nas dúvidas de Callum em escolher ajudar a empresa ou não; na relação dúbia com a cientista da Abstergo, Sofia (Marion Cotillard); no questionamento entre fazer o moralmente aceito e perder o livre-arbítrio ou abraçar o lado mais sombrio da personalidade e aprender a usa-lo.
Apesar de tudo isso constar no filme de alguma forma, é sem profundidade. Em certo ponto Sofia discute a necessidade de forçar Callum a ir longe demais para que ele aceite ajuda-la. Ela fala rapidamente: “Não estamos aqui para fazer monstros”. O que resvala rapidamente no que poderia ser a reflexão interessante é deixado de lado para que Fassbender tire a camisa, mostre como está com uma excelente forma física e comece uma cena de ação.
Mais um problema de Assassin’s Creed. A ação é feita o máximo possível com efeitos práticos, o que é bom, mas é filmada com a câmera muito próxima dos atores e dublês, o que impede o espectador de entender o que ocorre na tela. Ainda mais com cortes rápidos, que dão pouco tempo para passar noção de espaço e onde estão vilões e mocinhos em cena.
Em termos de roteiros, elas são ruins também. Existem quase exclusivamente nas sequências de Aguilar no passado. O personagem luta e se esforça muito, mas não tem tempo de tela para desenvolver a personalidade. É até difícil entender o que acontece com ele. Numa hora ele salva o príncipe de uma jaula, na outra ele está preso. Não tem ligação entre os dois momentos.
A fotografia é tecnicamente impecável. Trabalha o presente com tons monocromáticos e claros, como se a vida de Callum tivesse falta de cores e esperança. No passado, com Aguilar, os tons dourados tomam conta da produção para representar o brilho passado da ordem dos assassinos. A iluminação utiliza muita fumaça para que os feixes de luz fiquem visíveis. Tecnicamente, é impecável e bonito.
Os atores entregam o melhor que podem do que o roteiro lhes entrega. É muito bom ver gente como Fassbender, Cotillard, Jeremy Irons e Brendan Gleeson interpretar diálogos. Eles têm química e são bons. O texto é que os atrapalha. É possível ver nuances nas interpretações de todos eles.
Talvez o maior problema de Assassin’s Creed como filme seja justamente o estereótipo de ser uma adaptação de videogame, porque o grande nome por trás da produção claramente não esperava que pudesse haver muito a se dizer em um jogo eletrônico. Apenas ação. Infelizmente, o resultado é tão vazio quanto a compreensão de Fassbender.