Dois irmãos gêmeos, Lukas e Elias, se divertem sozinhos em uma casa maravilhosa, localizada em um lugar totalmente isolado, porém paradisíaco. O momento bucólico dos meninos, regado a brincadeiras inocentes em meio à natureza, é quebrado pelo retorno de Mamãe, que havia estado em uma cirurgia plástica e tem agora o rosto coberto por bandagens. Aos poucos, o comportamento estranho de Mamãe faz brotar nos garotos a suspeita de que a mulher que está em sua casa seja, na verdade, uma impostora.
A premissa do austríaco Boa Noite, Mamãe (Ich Seh, Ich Seh) já é, por si só, assustadora. A ideia de transformar a imagem da mãe, que representa de maneira geral a segurança e o conforto de nossa infância, em algo desconhecido e ameaçador é a principal fonte do medo da obra que conta com direção de Veronika Franz e Severin Fiala.
Boa Noite é, portanto, um terror psicológico. Muito mais do que o susto em si, prevalece a atmosfera de angústia, seja pela crescente tensão na relação entre as personagens, seja por cenas de tortura que fariam os produtores de Jogos Mortais sentirem inveja.
O filme é predominantemente silencioso, sem uma trilha sonora muito presente, com exceção da canção de ninar que colabora com a atmosfera sinistra – como, aliás, a maioria das canções de ninar o fazem em filmes do gênero -, mas muitas vezes o silêncio pode construir melhor a tensão do que um excesso de ruídos. Não há mudanças de cenários, tudo se passa dentro da casa e no bosque que fica em redor, com exceção da cena gravada rapidamente em uma pequena cidadezinha – tão vazia quanto a casa em que se desenrola o causo – e a igrejinha local. O silêncio e os espaços vazios colaboram para criar a sensação de solidão que ronda as personagens das crianças.
O elenco é pequeno e fora Mamãe (Susanne Wuest) e os gêmeos Lukas e Elias (Lukas e Elias Schwarz) apenas alguns outros personagens aparecem por poucos minutos, sempre para adicionar as pistas que os diretores vão jogando para o público. A religião é um elemento fortemente presente, e tratado com grande ironia: vemos uma crueldade quase natural nas duas crianças, que o cristianismo classifica como naturalmente puras e inocentes, e uma briga pelo poder com a figura materna, que é igualmente sacralizada pelos cristãos em geral.
A fotografia do filme talvez seja seu real destaque, e se houve quem se aborrecesse com o final de Boa Noite, será difícil encontrar quem critique o olhar profundamente estético de Franz e Fiala. Eles utilizam, inclusive, elementos grotescos ou escatológicos – como um cadáver de um gato boiando em um aquário de formol ou centenas de baratas empilhadas – para criar cenas esteticamente belas.
Boa Noite, Mamãe não é um filme para provocar grandes sustos ou fazer o coração de ninguém saltar pela boca, mas deve ser assistido, se não no cinema, pela internet mesmo. Certamente será – e já está sendo – largamente discutido por muito tempo, como a maioria das obras que causam discordâncias entre o público – haverá quem não goste, haverá quem gosta, mas a obra não será rapidamente esquecida.