Depois de cinco filmes munidos de muitos efeitos especiais e contextos de escalas gigantes, Jon Favreau resolveu fazer uma obra mais intimista. O currículo de sucessos garantiu sinal verde, mas é claro que o elenco de estrelas de Hollywood ajudou a conseguir a verba para fazer este filme pequeno. Finalmente Chef chega à cidade e surpreende com a sensibilidade de Favreau.
Carl Casper (Favreau) é um grande chef de um restaurante chique que quer inovar o cardápio para a chegada de um influente crítico culinário. Porém, o dono do estabelecimento frustra suas expectativas e os problemas escalam até manchar sua imagem pública. As dificuldades profissionais se refletem na vida pessoal e começam a afastá-lo do filho que tem com a ex-esposa.
Chef trata de culinária, que é um tema querido à Favreau, e de relações entre pai e filho. De forma bem simples, a busca de Casper para restabelecer sua carreira e seu prazer pela arte de fazer alimentos de qualidade é a chave para que possa fortalecer as conexões com o filho. Ao mesmo tempo, o filme busca retratar a cultura culinária de várias partes, e classes sociais, dos Estados Unidos.
Favreau é diretor, roteirista e ator principal do filme. Parece demais para um homem só, mas sem a pressão de uma Marvel nas costas, Favreau faz de Chef um filme muito mais equilibrado que os daquela franquia que ele dirigiu. Seu roteiro tem um pequeno problema. A trama de complicações na carreira de Casper se divide em duas, com direito até a um clímax no meio do filme. Porém, a trama de conexão com o filho segue o padrão correto. Sinal de que Favreau sabe o que é realmente importante em seu filme, as relações humanas.
Para construir a realidade, ele filma com eficiência os cuidados de Casper para fazer cada prato. O personagem tem paixão por comida e isso fica muito bem demonstrado através da forma que Favreau filma os pratos ficando prontos do ponto de vista do próprio personagem. A fotografia faz parecer que a luz vem dos pratos em ambientes fechados. Nos abertos, cria uma coloração mais quente para refletir os fortes temas latinos que fazem parte da trama. As escolhas de direção de arte são muito interessantes. Quando Casper desfruta do sucesso do início do filme, as cores brancas tomam conta da película. É um clima de limpeza e de inexpressividade. É classudo e rico, mas pobre em originalidade e em sensibilidade. É quando Casper começa a se desvincular da culinária de alta classe e vai assumindo as raízes latinas que o mundo fica mais colorido e suas roupas ficam mais escuras. Quando ele finalmente está satisfeito, usa preto.
Alta classe branca. Casper com os melhores amigos. Valorização das relações.
Casper é um mestre de culinária, mas também é uma pessoa normal. Não é metido ou esnobe. Muito pelo contrário, seus braços estão tomados por tatuagens, não tem problema com a presença de funcionários bêbados ou de ressaca. Inclusive, fala com eles usando gírias, palavrões e linguajar chulo. Poderia parecer uma forma indiscreta de contextualizar a produção, mas isso dá para ele e todo o resto do elenco humanidade e carisma. O diálogo auxilia com falas que soam naturais, mesmo quando os personagens se permitem gritar escandalosamente com raiva ou quando passam por momentos de tensão. Essa noção de pessoas comuns na trama também serve ao humor. O clima de descompromisso é convidativo para que o espectador queira rir junto deles, como se fosse parte de uma conversa entre pessoas legais e divertidas.
Em determinado ponto da trama, Casper, seu melhor amigo Martin (Leguizamo) e o filho fazem uma viagem através do país. De Miami até Los Angeles, passando por lugares como Nova Orleans, eles vão pouco a pouco experimentando das diferentes formas de alimento que o país tem a oferecer. Tem de tudo, pratos chiques e caros, sanduíches cubanos, carnes assadas de uma forma específica, mandioca frita e todo o tipo de coisa que entra no caminho. Favreau ainda aproveita para mostrar parte da vida musical e da cultura de rua de cada lugar. Revela um Estados Unidos bastante interessante e pouco representado pela cultura pop. Só por isso já seria uma excelente desculpa para assistir ao filme.
Experimentando as diferentes culturas através dos Estados Unidos.
Mesmo fazendo um filme divertido, Favreau dá destaque para o drama de Casper. Próximo ao final, demonstra que o chef sente-se só sem o filho deixando o personagem respirando em silêncio após se separar dele. É um take bastante longo dele percebendo aos poucos que sua vida é vazia sem a criança por perto. É corajoso de se fazer em uma comédia e demonstra a sensibilidade do diretor.
Favreau está excelente como Casper e parece ser quem realmente está preparando as comidas vistas na tela. O carinho por culinária parece ser compartilhado entre ator e personagem. John Leguizamo está ótimo como sempre. Infelizmente o eficiente ator latino ficou mais marcado pelo papel de Luigi na esquecível adaptação do Mario para os cinemas que por sua capacidade de criar tipos diferentes. Os dois são o charme do filme, mas é preciso citar grandes coadjuvantes em papeis pequenos como a Scarlett Johansson, o Robert Downey Jr., o Dustin Hoffman, a Sofia Vergara e o Oliver Platt. Todos muito bem, mas aparecendo mais como um favor em pontas pequenas.
Chef é um filme sensível com um toque cultural riquíssimo. Daquelas obras de culinária que dão vontade de sair do cinema e correr para comer algo tão bom quanto os pratos aparentam ser no filme. A história de pai e filho funciona muitíssimo bem e Favreau se revela um diretor muito maior que os espetáculos que formaram sua carreira atrás das câmeras.
FANTASTIC…