Dredd é um filme de acertos sobre uma ideia simples. É interessante como a proposta sem grandes ambições ganha proporção maior ao ser bem realizada em praticamente todos os pontos da produção. Do roteiro, passando pelos atores e a direção até a eficiente pós-produção.
A história se passa em um futuro pós-apocalíptico. Devastados por uma guerra nuclear, os Estados Unidos viraram uma megacidade cercada por muros que a protegem da radiação. Por conta do pouco espaço para uma população tão grande, mesmo com a cidade sendo enorme, criaram-se os juízes. Eles são uma mistura de policiais com tribunal completo. Aparecem nos locais, podem definir no momento a pena dos criminosos e executá-la.
O que significa que, caso seja pena de morte, os juízes podem matar os criminosos no local. O melhor dentre esses juízes é o Dredd. Ele está fazendo a avaliação de uma juíza novata chamada Anderson quando atendem a um chamado de homicídio em um megaprédio. Chegando lá, são presos em uma armadilha por conta da chefe do tráfico local e precisam sobreviver a todos os bandidos do lugar tentando matá-los.
O filme é a segunda adaptação dos quadrinhos britânicos. No material impresso, a premissa é discutir moral, ética e sistemas judiciários. Neste filme a discussão fica um pouco apagada por conta da história fechada no prédio. A ideia é usar o filme para apresentar o personagem e o universo e deixar as reflexões para uma continuação.
A trama no prédio segue o sub-gênero Duro de Matar. Mas a construção do roteiro faz um trabalho tão bom que não deixa aparente. Seja porque Dredd está quase sempre acompanhado por Anderson, seja porque a estética da violência é tão original. Ou talvez seja apenas porque o personagem é tão interessante, talvez tanto quanto o eterno John McClane.
Mais um acerto da produção é ser fiel ao original. Dredd nunca mostra o rosto nem fala seu primeiro nome. Ele representa uma justiça sem rosto, brutal, violenta e eficiente. Mesmo em momentos extremos, o personagem não deixa de seguir as regras e o padrão de como um juíz deve agir em campo.
Abre espaço para os roteiristas serem originais. Criando situações que dificultam ao máximo esse comportamento incorruptível de Dredd. Depois disso, fazendo com que o personagem contorne esse tipo de problema sem quebrar suas regras?
O filme ganha muito com isso. Dredd tem um suspeito de assassinato, mas não pode matar um réu por simples suspeita. Quando as portas do prédio se fecham e os dois protagonistas precisam lutar para sobreviver, ele não aceita as saídas fáceis para se livrar do criminoso. Então fica arrastando o sujeito pelo prédio através dos mais variados tiroteios. Mesmo com tantas complicações, continua analisando o comportamento de Anderson para dizer se ela será aprovada como juíza.
É como os personagens do Clint Eastwood em faroestes. Eficiente e brutal com poucas palavras. Dredd ganha força com a interpretação de Karl Urban. O ator se despe de qualquer vaidade ao se esconder por trás do capacete de Dredd e precisa construir toda a sua atuação apenas com a boca e com o gestual. No primeiro é esquisito, no segundo é maravilhoso. Ele fica com a boca contorcida o filme inteiro. Incomoda bastante.
A juíza Anderson também ganha uma ótima representante com a Olivia Thirlby. A personagem existe nos quadrinhos. É uma mutante por causa da radiação. Mas sem nenhuma deformação física. Anderson é uma médium com poderes para ler as mentes das pessoas ao seu redor. Thirlby dá a dramaticidade necessária para ela, ao mesmo tempo que seus maravilhosos atributos físicos. Pelas deusas, como essa mulher é bonita. Ela ainda faz cenas corajosas de nudez que não são gratuitas. É tudo pelo bem da narrativa e do desenvolvimento da história.
O grande atrativo do filme, porém, é a ação. A trama gira em torno de uma nova droga chama slow-mo que causa no cérebro a sensação de que o tempo está passando a um porcento da velocidade real. É a desculpa para que o diretor Pete Travis coloque câmeras de alta velocidade com contraste e brilho aumentados ao limite do realismo.
Essa estética ganha ainda mais beleza com o excelente 3D usado no filme. Os ambientes fechados do prédio ganham vida com a profundidade enquanto o diretor brinca a vontade colocando objetos em diversos planos.
São dois os erros da produção. Um pequeno, que é a presença da atriz Lena Headey. Impressionante como ela é inexpressiva. O outro é o marketing. O filme é violento pra caramba, com detalhamento gráfico absurdo. Mas, por algum motivo, o estúdio não o vendeu como uma ação adulta. Foi como um filme de ação genérico que ele chegou e como uma ação genérica ele foi ignorado nos cinemas.
O baixo retorno cancelou qualquer ideia de uma continuação. Apesar disso, o filme é adorado pela crítica e pelos fãs dos quadrinhos e não ficarei surpreso se ganhar algum status cult.
ALLONS-YYYYYYYYY…