Filmes como este Em Ritmo de Fuga seriam facilmente pensados como algo esquecível, não fossem as palavras Edgar e Wright junto dos créditos de direção. Com apenas cinco títulos no currículo, o britânico já é reconhecido com um dos grandes artistas de estilo do cinema atual. Com alguém como ele no comando, até um filme de sinopse simples de assalto a banco se torna algo grandioso.
Realmente, não há nada de novo na história de Baby (Ansel Elgort), um habilidoso motorista de fugas que participa de crimes para pagar uma dívida com o mafioso Doc (Kevin Spacey). Quando estiver livre dessa vida, pretende fugir com a garçonete Debora (Lily James) com o dinheiro que acumulou. Mas, como é comum nesses enredos, deixar para trás os pecados passados não é tão fácil.
Esse é um dos problemas em se basear apenas na sinopse de um filme para julgá-lo. Se a história de Em Ritmo de Fuga não apresenta novidade alguma, a concepção o faz transpirar criatividade por meios dos planos, das reviravoltas, dos personagens e das misturas de estilos que Wright sabe fazer tão bem.
Baby, o protagonista, tem um problema de ouvido que exige que ele escute música constantemente para poder se concentrar no mundo ao redor. Toda a linguagem é feita do ponto de vista do personagem, o que permite que o filme seja também um musical. Logo depois da primeira cena de perseguição, Baby dança pela rua enquanto vai comprar café.
Na cena sem cortes, as pessoas entram e saem da tela na medida em que o personagem os percebe e partes da letra da música aparecem pichadas no cenário no momento em que elas são cantadas na trilha sonora. Além da complexidade de filmagem (uma vez que a coreografia de câmera, ator, cenário e figurantes deve ser precisa), toda a técnica coloca o espectador dentro da perspectiva de Baby.
Com certeza, a montagem se torna importante para o estilo de clipe musical. Tanto pela mudança entre planos que acompanham as batidas das músicas, quanto pela mixagem de som. Em um tiroteio, os sons de metralhadoras acompanham a percussão de Hocus Pocus, da banda Focus.
Mas a mixagem vai ainda além na subjetividade, ela é trabalhada para funcionar em surround. Quando Bats (Jamie Foxx), um dos vilões, tira o fone de um dos ouvidos de Baby para descobrir o que ele escuta na cena, todo o lado direito da sala de cinema tem a trilha musical diminuída. É como se ele tirasse o aparelho da orelha da plateia.
Wright é inventivo na estrutura narrativa também. Apesar de ser uma trama comum, ele faz com que Baby seja um personagem rico ao tirar a capacidade do personagem de pensar nas próprias falas. Ele imita frases de todos os coadjuvantes e nunca pensa em nada de novo, mas tudo é reutilizado para ser uma expressão dele mesmo. Ao mesmo tempo, essa opção demonstra como o jovem sobrevive em um mundo no qual não pertence.
Para isso, Elgort se revelou uma escolha ideal para Baby. Apesar de simpático, o ator é limitado. Ajuda a construir o personagem que não sabe se comunicar adequadamente e precisa imitar os outros. Por outro lado, o passado de dançarino o fazem ter noção adequada de ritmo para acompanhar as coreografias complexas e deram o condicionamento para os momentos de ação física.
Tanto Debora quanto Darling (Elza González, a outra personagem mulher da produção) se encaixam como ferramentas de construção dos homens com quem têm interesse romântico. Os homens, por outro lado são muito bem construídos porque as mulheres servem de degrau para eles. Essa é, de longe, a pior característica de Em Ritmo de Fuga.
As reviravoltas brincam com estereótipos do gênero de ação. Os vilões trocam de função dentro da história, o que faz com que a morte de alguém em certo momento seja surpreendente e leve para um perigo maior minutos mais tarde. Isso é importante para a ação, porque cria tensão e medo pelos personagens. O suspense é uma constante que prende o espectador e emociona. Ajuda toda a ação ser feita em cena com carros reais e, mesmo assim, ainda acompanhar o estilo musical.
Em especial, é preciso parabenizar Wright pela escolha da dupla Jamie Foxx e Jon Hamm como vilões rivais. Os dois atores são uma potência em cena. Ambos são a fonte de grande parte da tensão que domina o filme a partir da segunda metade da produção.
Só não é possível dizer que Em Ritmo de Fuga é uma obra-prima porque a filmografia de Wright ainda pode se estender por muito tempo e, também, porque ele já realizou coisas como Scott Pilgrim Contra o Mundo. Ainda assim, filmes como os dirigidos por ele são eventos devido à originalidade estética e à coragem de ser diferente ao reinventar clichês.
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