Em 2009, a ideia de jogos de videogames com super-heróis era feita de frustrações passadas. Os melhores eram brincadeiras medíocres do Homem-Aranha. Ainda assim, os trailers deste novo Batman eram impressionantes. Todo o universo estava com todos os pés atrás. Com razão. O demo era uma delícia, mas esse tipo de material pode ser enganador. Em agosto, no lançamento, a reação geral era de surpresa. Alguns diziam até que era a versão de videogame dos ótimos filmes do Christopher Nolan.
Batman captura o Coringa durante um assalto com facilidade e o leva para o Asilo Arkham. Durante o processamento do vilão, ele escapa e inicia um elaborado plano dentro do manicômio. O homem morcego precisa confrontar os vários obstáculos através dos complexos da ilha para descobrir os objetivos do palhaço e impedi-lo.
A grande sacada do estúdio Rocksteady, que desenvolveu o jogo, foi focar em fazer com que a jogabilidade fizesse do jogador o Batman. Então a ideia é pegar bandidos de surpresa com uma penca de apetrechos e derrotá-los na base da porrada. Tudo com muita fluidez. A base é um botão de ataque para dar golpes e outro de contra-ataque, para defesa e continuidade de combos. De vez em quando, o Batman precisa derrotar um grupo de capangas com armas (que ele não pode enfrentar de frente). Daí ele precisa se esconder nas sombras e derrotá-los com esquiva e surpresa.
Apenas nisso, o jogo é lindo. A mecânica é gostosa e a sensação de derrotar dezenas de inimigos realmente faz sentir que é o herói. Mas apenas ser a máquina de espancar pessoas e bandidos não é o suficiente para fazer com que um jogo seja bom. Cansa rápido. É preciso algum desafio. Em entrevista, um dos produtores disse que o ideal é dar para o jogador habilidades aos poucos e para cada uma criar um design no qual ele aprende como usá-las. Então, coloca um tipo de inimigo novo capaz de colocar a habilidade em uso. O jogador fica melhor, tem mais o que fazer, mas também tem mais dificuldade com os obstáculos.
Quanto aos objetivos, o roteirista Paul Dini (do desenho clássico da década de 1990) escreve uma trama complexa na qual o morcegudo precisa ir de prédio em prédio, contra diversos inimigos clássicos, para descobrir aos poucos o que o Coringa pretende. No caminho, Hera Venenosa, Croc, Espantalho, Victor Szaz, Bane e outros bandidões dão as caras. Cada um com um desafio diferente. Um cria uma perseguição claustrofóbica num labirinto subterrâneo, outro é desculpa para fases tiradas de pesadelos. Alguns geram desafios mais físicos. No final, é aquele amontoado de desculpas de jogos eletrônicos para que o jogador vá de um lado para o outro. A diferença é que Dini dá fidelidade aos personagens e cria diálogos muito espertos. Sem contar que explora diversos conceitos bons deles. Como a incapacidade do herói de matar e a necessidade do vilão de enfrentar o arqui-inimigo.
Batman e Coringa. Inimizade platônica.
Para acrescentar a essa qualidade específica, diversos dubladores do desenho foram chamados para reprisar os papéis. Dentre todos, o destaque vai para Kevin Conroy como Batman e Mark Hamill (sim, o Luke Skywalker) como o Coringa. Na época, parecia absurdo comparar com o icônico Coringa do Heath Ledger, mas Hamill com os textos de Dini se torna memorável. Dini, como roteirista veterano do herói, sabe como construir em cima de toda a mitologia prévia. Barbara Gordon já está presa a uma cadeira de rodas, dois ou três Robins já deixaram de andar com o Batman e diversas das histórias principais são passado. O que leva a uma qualidade e um defeito.
A qualidade está relacionada a um arco narrativo previsto para iniciar aqui. Os eventos de Arkham Asylum conduzem às duas continuações que viriam depois. Ainda assim, a trama de Asylum é fechada em si. Ao levar em consideração que roteiros de videogames são difíceis de escrever porque eles normalmente precisam se adequar às ideias de design concebidas antes da história, fica ainda mais impressionante. O único grande problema dessa narrativa é o próprio material original.
Eis o defeito. O Batman é, na definição base, ridículo. O próprio jogo o descreve como um homem que treinou o corpo e a mente ao limite da perfeição. Um homem tão avançado que não consegue evitar ficar triste sempre que é lembrado da morte dos pais e criou um carinho bizarro pelo maior rival. Principalmente, um homem com sérios problemas psicológicos. Não fosse o bastante, enfrentar um homem crocodilo gigante, pessoas transformadas em monstros por conta de um veneno, uma mulher que controla plantas e outros tipos de estupidez do tipo não ajuda. Nesse mundo de excesso, ainda é preciso que os seres vivos sejam umas caricaturas bisonhas. Os homens são excessivamente musculosos (inclusive o idoso comissário Gordon) ou são deformados (o Coringa é quase um amontoado de riscos). As mulheres são ainda piores. As duas únicas são desenhadas para ser absurdamente sexualizadas. A Arlequina até faz sentido com a origem e o que é, mas a Hera Venenosa está praticamente pelada. Pra quê isso? Felizmente, a linguagem boba das HQs funciona nos videogames.
Honestamente, precisa desse exagero?
Batman: Arkham Asylum ainda é uma experiência maravilhosa. É gostoso fazer a escalada dos poderes do personagem e descobrir como derrotar inimigos que seriam imbatíveis para pessoas normais. Ao final, chega a ser divertido ver como o Batman, comandado pelo jogador, consegue espancar dezenas de homens entre dois ou mais monstrengos que o enfrentam de uma vez. Ficou com gosto de quero mais e, para isso, a continuação da trilogia teve efeito.