Antes de qualquer pessoa com o background do escritor deste texto discorrer sobre a adaptação Macbê: Sangue Chama Sangue, é preciso explicar o embasamento tanto em teatro quanto em Shakespeare dessa pessoa. Praticamente nulo. Como alguém que cresceu em adoração ao cinema, com alguma frequência era confrontado com a linguagem teatral. Um conflito leve e velado entre as artes criou um pré-conceito infantil. Portanto a dica é que o leitor tenha noção de que este é um texto mais de opinião pessoal que de análise crítica.
Para os entendidos, fica óbvio imediatamente que é uma adaptação do texto Macbeth. Assim como no texto clássico, a história começa quando os guerreiros do exército escocês, Macbeth e Quanto, recebem uma previsão dos futuros de ambos. O primeiro ganhará dois títulos improváveis e o segundo será poderoso, feliz e terá herdeiros nobres apesar da insignificância histórica. Daí para frente, Macbeth passará por diversas conspirações de nível de realeza em busca deste futuro brilhante.
A brincadeira com o nome complicado do personagem principal já denota alguma invenção narrativa. Essa se revela rapidamente, após a apresentação das três bruxas que preveem os eventos da peça. Quando um apresentador de talk show entra no palco e, junto delas, lê o futuro de Macbeth e de Banquo. A plateia cai na gargalhada quando qualquer dos cinco apresentadores que tomarão o palco através da apresentação chamam o protagonista de Macbê e são corrigidos imediatamente por ele. Poderia ser uma zombaria sem sentido, mas funciona porque a linguagem televisiva contextualiza diversas situações que requereriam elenco e produção maiores.
Victor Odecam como Macbeth (Fotos do Flickr: Larissa Souza).
Logo no começo, uma apresentadora de jornal entrevista Macbeth e Banquo. Ela recebe pelo comunicador a última novidade. Macbeth ficou com o cargo de conde de Cawdor após a morte do anterior. Assim, o público descobre junto com os dois que as previsões se tornam realidade. Mais para frente, outros recursos são utilizados, como uma câmera subjetiva projetada atrás do palco para que a Lady Macbeth acompanhe com os espectadores um assassinato nos porões do próprio teatro. E até chamam alguém do público para participar em uma ponta hilária.
Ao mesmo tempo em que a inventividade linguística cria um frescor e permite uma compreensão melhor para um público moderno, o humor constante acaba por atrapalhar momentos que deveriam ser tensos. O momento em que Macbeth é visitado por um fantasma gera gargalhadas que não deveriam se encaixar naquele ponto do enredo.
Quanto ao texto original, não existe o direito de fazer uma crítica. Apenas se trata de uma obra secular do que é considerado por aí como o maior romancista da história. Shakespeare foi muito inteligente ao fazer uma brincadeira com expectativas. Tanto Macbeth quanto Banquo recebem uma leitura verdadeira e positiva do futuro. Mesmo assim, o que se sucede é terrível para ambos. Ao mesmo tempo, existe uma leitura dos contextos políticos do período (a peça é inspirada em fatos reais) e uma analogia sobre a ambição desmedida.
As três atrizes que interpretam Lady Mcbeth (Fotos do Flickr: Larissa Souza).
Amei os atores e a troca dos mesmos entre os personagens. Não sei se é assim no texto original, mas três atrizes fazem Lady Macbeth e dois atores fazem o esposo. Em uma leitura rápida, a troca é feita entre momentos diferentes dos personagens. Cada atriz faz um sentimento diferente da lady, assim como cada ator cria um nível de culpa para Macbeth.
A apresentação foi um projeto de conclusão de curso para formandos da turma de Artes Cênicas da UnB. Infelizmente só teve três apresentações, sexta, sábado e domingo (à qual compareci). Não sei se haverá outros momentos em outros lugares, mas já estou de olho nos próximos trabalhos da diretora Felícia Johansson e de alguns integrantes do elenco. Recomendo fortemente procurar o texto de Shakespeare, que leio no momento, e pesquisar os artistas da encenação.
ALLONS-YYYYYYYYY…
Apresentaremos novamente 3 de outubro na abertura do festival FESTA e também, para conclusão do projeto, em novembro e dezembro, ainda sem local definido.
– Anna Salles (aka a última Lady Macbeth da peça)