Em certo ponto de Frances Ha uma personagem fala sobre como o timing da protagonista é perfeito. Funciona na cena como ironia ao fato de que o timing foi todo errado e os planos não correram bem. Mas o espectador sabe que a ironia da fala vai além disso. O timing é errado para tudo que Frances faz no filme. O que é ótimo.
Eu poderia dar diversas sinopses para o filme. Mas acho que a mais apropriada é a que pensei enquanto via os créditos finais. O filme conta a história de uma bailarina de Nova Iorque próxima dos trinta anos em busca de uma casa para chamar de sua. É bem simples, mas tem tantas camadas que é possível tirar diversas sinopses daí.
A busca por uma casa representa um universo inteiro de conflitos. É a tomada de responsabilidades. Ter uma casa própria significa literalmente que Frances finalmente amadureceu e virou uma adulta. E acompanhar a jornada da protagonista é maravilhoso.
Isso acontece porque Frances é maravilhosa. Não é o tipo de pessoa que você certamente gostaria de conhecer pessoalmente, mas na tela é adorável e extremamente compreensível. Ela é como uma criança crescida. Vive o momento, sem pensar no futuro. É dispersa e nunca está completamente envolvida em uma conversa. Mesmo quando foi ela quem começou o diálogo.
Eu até conheço pessoas que são como Frances. Pessoas que não gosto. Mas é o trunfo do roteiro e da direção. Compreendemos e gostamos dela. Ela corre na rua com uma excelente trilha sonora. Dança em casa sem música. Puxa briguinhas de brincadeira com pessoas desconhecidas. Está sempre de bom humor, mesmo sem motivos.
Frances é, enfim, uma pessoa cheia de vida.
Greta Gerwig, a atriz que a interpreta, participou da concepção do roteiro junto com o diretor, Noah Baumbach. Os dois merecem admiração por diversos motivos. A começar pelo próprio roteiro.
Frances Ha segue uma estrutura bem padronizada de roteiro. O que não seria necessário considerando que se trata de um filme independente que quebra com a lógica estabelecida. Somos apresentados a Frances, seu mundo e as pessoas que vivem nele. Aos poucos vemos ela passar por pequenas vitórias e derrotas chegando ao ponto mais baixo antes que ela tome a decisão final que vai definir toda a jornada.
Mas a forma com a qual Baumbach filma isso dá uma leveza pra tudo. É uma mistura do incrível espírito de Frances com uma ironia constante. É impossível não sorrir das graças da protagonista ao mesmo tempo em que a comédia criada faz com que quase não paremos de rir. São situações constrangedoras aqui, silêncios sem graça ali.
Baumbach fez o filme com câmeras digitais em preto e branco e filmava cada cena com diversos takes. Cada take com os atores improvisando de uma forma diferente. Dá um tom de leveza ao mesmo tempo em que sentimos uma naturalidade. Cada personagem parece uma pessoa de verdade, com características próprias e ricas.
E Gerwig está excelente como Frances. Sua interpretação exige um desprendimento tão grande. Ao mesmo tempo em que é preciso um certo nível de graça. Ela tem um daqueles rostos que você tem certeza que já viu em algum lugar. Só mais tarde que lembrei dela como a namorada traída do Jesse Eisenberg em Para Roma com Amor.
O título é extremamente apropriado. O nome completo de Frances é desconhecido. Ha é o máximo que descobrimos de seu sobrenome. Funciona tão bem porque é mais ou menos como ela raciocina. Ela desvia a própria atenção com tanta frequência que é como a conhecemos. Quando ela está se apresentando desvia o foco e pegamos seu segundo nome pela metade.
Ao término de seus menos de 90 minutos Frances Ha é um dos melhores filmes em cartaz. Ficando entre excelentes obras, como Hannah Arendt e Círculo de Fogo. É uma alegria assistir um filme tão bom e divertido entre as porcarias vistas recentemente.
GERÔNIMOOOOOOOOO…
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