Em 1984, Steven Spielberg pegou um roteiro de um estudante de cinema, chamou um diretor de filmes B e produziu um dos clássicos de natal mais diferentes e anárquicos. Justamente por conta do clima de ceticismo e contracultura é que Gremlins sempre parece tão interessante de se rever.
Billy Peltzer ganha de seu pai um bichinho estranho e diferente de uma espécie desconhecida chamada Mogway. O bichinho é batizado como Gizmo e vem com três regras específicas de cuidado. Sem compreender direito a lógica dessas regras, Billy as quebra e acidentalmente transforma a cidade pequena em que vive em uma pequena área de horror e morte. O tom de terror se mistura com comédia do estilo dos Looney Tunes (que ironicamente ganharam um filme das mãos do diretor anos mais tarde) ou dos Animaniacs. A anarquia das piadas de seres sem limites ganha um peso maior ao ser colocada entre humanos comuns. Tudo em uma grande discussão sobre os defeitos da sociedade capitalista e conservadora.
Billy assiste TV com Gizmo. Bichinho de estimação
Segundo roteiro do Chris Columbus a ser levado para as telas, Os Gremlins foi o motivo pelo qual o realizador foi parar debaixo das asas de Steven Spielberg, para quem escreveu depois Os Goonies, O Enigma da Pirâmide e o primeiro argumento de Indiana Jones e a Última Cruzada. Se analisarmos a carreira de Columbus, poderemos notar uma capacidade de recriar humor caricato dentro do universo suburbano da classe média americana. No caso de Os Gremlins, ele inicia a história com a apresentação de uma cidade de interior com todos os elementos que serão importantes mais para a frente, quando as ações dos Gremlins utilizarem os cenários e objetos de cena para as crueldades que praticarão. As mortes são violentas e beiram o visceral, mas o humor insano das criaturas não perde a graça, mesmo quando defenestram uma senhora idosa com a cadeira mecânica que ela usa para subir as escadas da casa. Nota-se uma visão criativa típica de crianças de olhar para um objeto novo e imaginar como usá-los de maneiras inventivas.
Joe Dante, o diretor, vinha dos filmes b. A realização anterior conta com Grito de Horror, clássico de lobisomem da Hammer, e Piranha. O estilo ditou toda a carreira cinematográfica de Dante. Seus filmes possuem direção de arte que flerta com o bizarro e quase sempre ficam no limite de se tornarem horror. Basta lembrar do rosto do Martin Short se alterando enquanto o ator grita de dor em Viagem Insólita, uma típica aventura oitentista. Talvez não fosse possível encontrar um diretor melhor para retratar as criaturas que fazem rir enquanto matam cruelmente personagens que já haviam cativado o espectador. Não é a toa que um dos poucos personagens que mostra morrer diante das câmeras é a mulher malvada, quase pior que os bichinhos que a assassinam. Justamente a morte que mais provoca risada. Ele muda as cores da fotografia para anunciar os eventos por vir. Quando os Gremlins dominam, o verde toma conta, se um ambiente em que um personagem entra é perigoso, as cores são azuis, brancas e duras. O vermelho, por sua vez, representa o clima de terror por onde os bichos já passaram. Melhor ainda é perceber que a combinação das cores é também as cores típicas do natal.
[youtube=https://www.youtube.com/watch?v=euhUfZGddwk] Gizmo acompanha teclado. Tema musical clássico.
Columbus e Dante fazem um comentário sarcástico acerca da data comemorativa. O único momento em que se menciona o valor do natal, a mocinha explica porquê o odeia e tanto Billy quanto o espectador não podem discutir. Ela tem razão para odiar o natal e tudo o que ele representa. Mesmo tratando da celebração, pessoas morrem, crianças perdem os pais e, como o filme faz questão de lembrar, é a época em que os índices de suicídio aumentam. A ironia se encontra em diversos níveis como com a abertura que remete aos filmes natalinos das décadas de 1930 e 1940. Ou então quando a mãe de Billy assiste a A Felicidade Não se Compra e percebe o quanto o filme é triste. Afinal, vale lembrar que é sobre um homem que decide se matar no natal. Tudo com sarcasmo para tratar da sociedade. Quando o filme termina, o protagonista escuta de um misterioso homem de uma terra exótica que os Estados Unidos não estão prontos para a magia e bondade de seres como Gizmo. Sempre embalado com o comentário da trilha irônica de Jerry Goldsmith, que tem sonoridade cômica quando os Gremlins são maus e de terror quando eles são engraçados.
GERÔNIMOOOOOOOO…