Três variações daquela velha expressão “Eu sei o que é melhor para você.” são ditas durante Homens, Mulheres e Crianças. Das três vezes, apenas uma é verdade. O mais assustador é que os pais dizendo isso para os filhos não fazem ideia de que estão equivocados. O que pode ser mais assustador que uma sociedade na qual os pais não sabem que estão errando com as crianças?
O filme acompanha um grupo de famílias de uma cidade. Um pai e um filho que precisam lidar com o abandono da mãe que fugiu para a Califórnia. Uma mãe que vigia toda a vida on-line da filha, verificando interações no facebook e até no celular. Um casal que se ama, mas não consegue mais sustentar a vida sexual e começa a pensar em traição. Uma mãe que expõe a filha pensando em torná-la famosa. Uma garota que sofre de anorexia e se mutila por conta da paixão por um carinha popular. Um garoto que está tão viciado em pornografia que não consegue se excitar com mulheres normalmente.
Casal com dificuldades sexuais.
A discussão é acerca das relações humanas. À princípio, parece uma demonstração de como a internet torna as conexões estéreis, mas o filme desenvolve um raciocínio diferente. Os chats, o facebook, o tumblr, as formas de trocar mensagem. Todos eles fazem com que as pessoas estejam fisicamente mais distantes, mas ainda capazes de interagir e criar conexões. O problema não se encontra na internet, mas nas pessoas que não conseguem se abrir umas com as outras. Seja pessoalmente ou digitalmente.
Jason Reitman se une à roteirista Erin Cressida Wilson para adaptar o livro de Chad Kultgen. As habilidades de Cressida Wilson são ideias para este tipo de filme. A história se baseia em pequenas tragédias melodramáticas, mas o tom é contido. Poucas vezes pessoas vão gritar ou sair correndo em desespero, mesmo que suas reações sejam de grande escala, como aceitar abuso sexual ou fugir de casa. A narrativa muda entre cada história com elegância e faz com que todas sigam o mesmo ritmo de crescendo do roteiro. Porém, toda a estrutura se baseia numa analogia das jornadas dos personagens com o vídeo Pale Blue Dot (Pálido Ponto Azul em tradução livre) do Carl Sagan. Inúmeras imagens da sonda Voyager viajando sem rumo pelo universo contrapõem os momentos da trama. Porém, essa analogia não serve ao filme como um todo, apenas para a trama do garoto que perdeu a mãe. Parece inadequado para todo o resto.
Reitman também é o diretor e demonstra mais uma vez sua eficiência. Usa de gráficos animados para representar as interações digitais, coloca a câmera atrás de objetos e partes do cenário, como se o espectador estivesse espionando os eventos. Quando as coisas ficam tensas, a câmera segue tudo tremendo. Sempre saindo de um belo enquadramento, fazendo o movimento completo e fechando em outro belo enquadramento. As luzes são quentes e a direção de arte enche os ambientes de itens vermelhos. Tudo fica um pouco mais escuro e nervoso, criando claustrofobia.
Um dos pontos mais fortes é o elenco. O Adam Sandler está ótimo. Só precisa de um bom diretor e um bom personagem para atuar de verdade. A Jennifer Garner é um poço de nervosismo como a mãe que não consegue deixar de vigiar a filha. Uma tal de Rosemary DeWitt mantém o nível como a esposa de Sandler. A Judy Greer compõe uma mãe com culpa reprimida. A atriz está cada vez melhor e merece todo o destaque que vem recebendo. Mas a surpresa entre o elenco adulto é o Dean Norris. Mais conhecido como o cunhado policial de Breaking Bad, ele faz um pai simpático que não compreende as escolhas do filho ou da ex-mulher e está perdido no mundo.
Ansel Egort e Kaitlyn Dever. Os dois roubam o filme.
O elenco jovem também faz um grande trabalho. Uma menina chamada Olivia Crocicchia faz a garota preparada desde nova para ser uma celebridade. Ela está brilhante como uma garota que aprendeu a ser fria e calculista em suas relações sociais. Outra chamada Elena Kampouris faz a garota anoréxica e com problemas de autoestima. Impossível não se apiedar dela nem sentir desconforto a medida em que ela começa a sofrer abusos do garoto de quem gosta. O destaque fica com o Ansel Elgort, que vem se revelando cada vez mais um grande ator, apesar de sua cara de sonso, e com a Kaitlyn Dever, a menina vigiada de forma extrema pela mãe. Os dois roubam o filme e sempre que a história vai para outros personagens, eles deixam saudades.
Homens, Mulheres e Crianças é mais um passo de Jason Reitman para mudar o foco de sua carreira para dramas mais pesados e sérios. Ao contrário de Refém da Paixão, ele sai do romance puro e mergulha em conceitos mais atuais e relevantes, apesar de manter o tom de melodrama.
GERÔNIMOOOOOOOO…