Jack – O Caçador de Gigantes

O Bryan Singer é um criador inquieto. Chegou na indústria com filmes independentes que chamaram as atenções de todo mundo. Trabalhou com os estúdios em uma das maiores franquias de histórias em quadrinhos cujo sucesso nos cinemas se deve em grande parte ao seu talento. Quase destruiu a franquia do Superman para a Warner, enquanto criou um dos maiores sucessos da TV nos últimos anos com House. Tirou o Tom Cruise do marasmo depois de algumas loucuras com um bom drama de guerra. Foi um dos responsáveis por fazer com que aquela primeira franquia em que trabalhou voltasse a ser boa. E agora voltou aos cinemas com Jack – O Caçador de Gigantes.

Lá pelas idas do lançamento de Operação Valquíria, ele recebeu a proposta de dirigir o filme. A ideia do roteirista Darren Lemke era fazer com que João e o Pé de Feijão ganhasse tons de aventura estilo Star Wars, com comparações diretas entre o personagem principal, que chegou aqui como Jack, e o Luke Skywalker. Singer se reuniu com seu parceiro usual Christopher McQuarrie e reescreveu o roteiro.
Jack é um fazendeiro comum, que recebe um chamado à aventura quando tudo o que tem, mais a princesa do reino por quem se apaixonou, são levados por um pé de feijão que cresce do solo abaixo de sua casa até os céus. É a típica estrutura da jornada do herói. Jack sobe a planta com a guarda real e descobre que as lendas do reino sobre gigantes são reais.
Ele atravessa um “portal mágico”, aqui representado pela planta. Aos poucos descobre sua nova natureza de herói, encontra um mestre e companheiro de aventura no líder da guarda, Elmont, precisa salvar a princesa em perigo e por aí vai. O trio principal remete bem claramente ao Luke, o Han Solo e a princesa Léia. A diferença é que Singer cria uma ambientação que mistura a inocência dos contos de fada, flertando com a brutalidade do mundo real.

A princesa, Jack, Elmont, o rei e a grande maioria dos personagens são ingênuos. Mas ingênuos com conhecimento das mazelas do mundo. Jack é pobre, passa fome e sabe que deve temer as pessoas. A princesa quer conhecer o reino para poder ser uma regente mais adequada, mesmo sabendo que foi o que matou sua mãe. Elmont é obediente e cheio de honra, mas sabe reconhecer que precisa lidar com a corrupção do mundo ao seu redor. É uma fantasia infanto-juvenil. O reino é medieval, mas todo mundo é limpo, as cores vibram e tudo é bonito.
A princípio incomoda, principalmente quando Jack começa a escalar o pé de feijão com a guarda real. Durante a subida eles enfrentam diversos desafios. E para quem sofre de vertigem deve ser terrível ver aquelas cenas com o 3D extremamente realista do filme. Mas essa parte é tão mal montada que incomoda. Os enquadramentos são lindos, colocando o pé de feijão em contraste com o reino, com os céus e eventualmente com a terra dos gigantes. É um pena que não funcione porque Singer não dá ambientação.

Quando chegam no reino dos gigantes o filme decola. O tom de aventura que já era flertado desde o começo se desenrola completamente. Os gigantes são ameaçadores e perigosíssimos. Possuem uma profundidade surpreendente para suas motivações. Singer constrói cenas com suspense inteligente. Constantemente alguém está em perigo e passando por algum tipo de ação elaborada. Mas ao invés de seguir pelo viés de grandiosidade, os problemas são resolvidos sempre com alguma coisa simples, seja ela uma faca de cozinha ou uma colméia de abelha.
O ritmo se mantém até o final e o roteiro não se perde. Existe até um MacGuffin esperto, que conduz a trama e o foco. O elemento narrativo é representado aqui por uma coroa mágica. Graças a ele, nunca se perde a atenção para os possíveis perigos ou eventos necessários para a continuidade da história.
No terceiro ato surge uma batalha com os gigantes tentando tomar o castelo dos heróis. A escala é enorme, com uma ótima condução. Ao contrário das outras reinvenções de contos de fada recentes, as batalhas são críveis e não deixam o espectador se perder.
Os atores estão soltos. Ewan McGregor não se importa em esconder a influência do Errol Flynn. Ele tem até o cavanhaque, os figurinos e o cabelo do ator clássico. Gosto do Nicolas Hout, mas ele parece um pouco fora de lugar com seu Jack. O Ian McShane começa incômodo como rei, mas aos poucos revela uma humanidade bonita. A vergonha fica toda no Stanley Tucci, que cria um vilãozinho bobo e caricato. A princesa da novata Eleanor Tomlimson é linda, carismática e autosuficiente. Mas o filme está nas mãos do gigante Fallon, que tem duas cabeças e é interpretado pelos inspirados Bill Nighy e John Kassir. É o personagem mais profundo e rouba todas as cenas em que aparece.

A solução final é o que mais incomodou. É absurdamente machista e estúpida. Não posso dizer o que é, mas posso dizer que é risível. Seja como for, ela é necessária para que todas as pontas soltas sejam fechadas. Sem ela, o casal não pode ficar junto e a proposta final fica sem sentido.
É uma divertida aventura bem estruturada. O diretor comete uns deslizes aqui e ali, o tom não é muito consistente e o final beira o ridículo com o machismo. Mas a diversão é garantida. Recomendo fortemente assistir em 3D.
 
GERÔNIMOOOOOOOO…