Poucas pessoas no Brasil sabem sobre a franquia Jack Ryan, mas ela faz muito sucesso em seu país de origem. O personagem foi criado pelo autor Tom Clancy em plena Guerra Fria, quando ele teorizou sobre um suposto submarino russo desaparecido. Apesar de o fato ter sido negado pelos governos, Clancy conseguiu seu lançamento como escritor ser um best-seller.
Quase trinta anos depois, o quinto filme inspirado no personagem do livro chega aos cinemas com seu quarto intérprete. Operação Sombra é o primeiro da série que não adapta nenhum dos livros de Clancy. A ideia é reiniciar a franquia cronologicamente antes da primeira aventura do analista da CIA.
O filme começa com Ryan realizando seu doutorado de economia em Oxford. Chocado com a queda do World Trade Center, ele se alista querendo fazer a diferença para seu país. Mas com pouco tempo em serviço, o agente se fere e recebe a oportunidade de finalizar seu doutorado para se tornar analista econômico da CIA. Tudo vai bem até que ele percebe transações suspeitas de uma empresa russa.
Daí muitas coisas se explicam sobre essa reinvenção do personagem. Primeiro, modernização em diversos níveis. Se antes as tramas de espionagem tratavam de submarinos nucleares e cientistas desaparecidos, o novo Ryan se encontra no meio de uma guerra fria entre mercados financeiros. Nada mais adequado para um tempo em que praticamente todo o mundo tem passado por crises econômicas.
Outra novidade importante é que se trata de um Jack Ryan pós 11 de setembro. Ele ainda é um analista de inteligência, mas para um personagem tão patriota quanto, ele precisava estar interessado em ingressar no exército na época da guerra do Iraque.
Também é importante levar em conta como o filme faz com que os russos voltem a ser os vilões. Porém, a nova guerra fria trata de corrida por dinheiro, não por contextos econômicos como capitalismo e comunismo. É um pouco forçado, mas tem algum sentido e abre espaço para que os russos possam ser os vilões de um possível remake de Caçada ao Outubro Vermelho.
E o mais importante. Apesar de tanta contextualização atual do personagem, ele continua o mesmo Jack Ryan da década de 1980. Assim que assume a função de analista em um escritório, ele se sente confortável. Não é treinado para operações de campo nem sabe como lidar com confrontos físicos.
Literalmente, quando ele se mete em uma briga ou luta, Ryan sobrevive fugindo e escapando por sorte. Em uma perseguição, perde o carro que estava seguindo porque bate em um caminhão. A força do personagem reside em sua capacidade de prever ações políticas baseando-se em informações públicas.
Por outro lado, sem uma trama criada pelo Tom Clancy, o enredo de enganações e ameaças sutis é todo construído por clichês. Tem a cena do vilão matando o capanga que comete um erro inocente para mostrar como ele é malvado. Ele também tem uma condição meio bizarra que remete bastante aos inimigos do James Bond.
Todo o suspense circula ao redor de um atentado terrorista. É a mesma coisa de sempre, com as forças especiais procurando bombas em Nova Iorque.
Mas clichês existem por um motivo. Quando são usados pela primeira vez, antes de serem clichês, são tão bons que se repetem à exaustão e cansam. Principalmente porque a maioria das pessoas que usam clichês não o fazem bem. Porém, o diretor Kenneth Branagh se mostra muito melhor com suspenses de espionagem que com fantasias shakespearianas.
Apesar de não haver nada de novo nas correrias de Ryan, o ritmo é bom, o suspense é bem construído e as cenas funcionam muito bem. Branagh não deixa o espectador ficar perdido em suas cenas de ação muito bem conduzidas. Com exceção de uma luta no clímax em que não tem como saber o que está acontecendo entre os dois personagens.
Também ajuda ter um bom ator como o Chris Pine incorporando muito bem um personagem que já passou por diversos erros. Com o apoio de um excelente veterano como o Kevin Costner fica mais fácil. Branagh também participa como o vilão russo Cherevin. Cada cena em que o ator britânico aparece é dele, roubando as atenções para si. O elo fraco do elenco é a Keira Knightley, muito fraca como a noiva ciumenta de Ryan.
O filme se focou tanto em construir o universo no qual o personagem se desenvolve através dos livros que criou uma trama de espionagem mais fraca. Não compromete, mas deixa uma sensação de que poderia ser muito superior. Principalmente quando temos um roteirista do calibre do David Koepp. Ainda consegue ser melhor que os filmes de Ryan com o Harrison Ford.
FANTASTIC…