Em determinada cena de Até que a Sorte nos Separe 3, o personagem Faustino é recebido com risadas por um bilionário. O homem, entre os risos, consegue um pouco de fôlego pra sugerir que precisa da “sabedoria das massas” no negócio dele. De forma bem simples, a cena consegue representar as ideias por trás da realização da trilogia de comédia protagonizada pelos gritos do Leandro Hassum.
Tom, filho do homem mais rico do Brasil, Rique Barelli, se apaixona por Teté e a pede em casamento. O pai dela, Tino, faz questão de pagar pela cerimônia, mesmo que ele seja apenas um vendedor de doces no trânsito. Para garantir uma festa de nível para o filho, Rique oferece um emprego de salário alto para Tino. Dentro da empresa, porém, Tino consegue estragar uma negociação e falir todo o país.
A ideia para dar continuidade à franquia sobre a família que não consegue se manter rica, por mais que ganhe fortunas, é boa. Depois de aceitar a ideia de pobreza, Tino precisa tentar manter alguma ordem na confusão que surge quando todos ao redor perdem dinheiro. O problema é que a produção tenta explicar as causas para a crise econômica do país.
Casamento com pompa. Conflito final sem sentido.
A trama de falência do país não é realmente um conflito para Tino. É apenas uma desculpa para piadas. Não há uma solução possível ou necessária. Em um momento a poeira simplesmente abaixa e nada mudou, os personagens não precisaram tomar ações ou qualquer coisa. Então, com quase meia hora para que a produção termine, o casamento de Teté e Tom passa por uma crise. As questões sobre dinheiro são abandonadas e o filme tenta realizar um final tocante.
Tenta porque não consegue. Não há construção de personagem ou de trama para que o tal momento acolhedor faça sentido. Muito pelo contrário. Quando Tino tenta passar alguma sabedoria para a filha, parece apenas que o espectador saiu de uma sala de cinema e entrou em outro filme. Tino é um grosseiro e estúpido que precisa gritar constantemente as idiotices nas quais acredita. Não há um momento sequer no qual se revele algum escrúpulo, inteligência ou boa vontade no personagem. Por isso, quando ele começa um monólogo sobre a sabedoria da pobreza ele se torna incoerente.
Mas tudo bem pelo filme. A reflexão que ele propõe se adequa a esta incoerência. Em certa cena, um homem rico, dono de fazenda, aponta quais o problemas do país. A população pobre é consumista demais enquanto a rica se arrisca em excesso por conta de ambição desmedida. Isso é dito como se fosse a maior verdade que a produção pode passar para quem a assiste. Os pobres do Brasil são pobres porque não sabem economizar e o ricos põem tudo a perder porque querem ser mais ricos.
Aílton Graça. Nem os gays escapam dos estereótipos no filme.
Esse reducionismo econômico é perigoso. Principalmente porque o filme retrata os pobres como ignorantes que não merecem receber dinheiro. Da mesma forma que mostra os ricos como pessoas mesquinhas e sem cuidado. Ou seja, o povo brasileiro é tosco. O raciocínio ganha forma nas palavras da esposa de Tino em certa cena: “Você tira a pessoa da merda, mas não tira a merda da pessoa”.
Quando a solução para tudo se encontra em um senhor idoso que sustenta uma fazenda com inúmeros empregados, a reflexão preconceituosa ganha ainda mais destaque. Pior ainda quando todo o humor da produção se baseia nos improvisos de Leandro Hassum como Tino. Não há qualquer tentativa de criar personalidade para o personagem. Ele está lá para desempenhar um único papel. O de gritar piadas sobre pobres, gays ou sobre mulheres.
Não há salvação para ninguém. Todo mundo em Até que a Sorte nos Separe 3 é preconceituoso, com problemas em relação à sexualidade, e reducionista em relação ao povo brasileiro. Tudo a favor do humor do gordo que grita. Agora Leandro Hassum que grita, porque o comediante emagreceu. Ainda tem cenas constrangedoras do ótimo ator Aílton Graça com deboches de gays em meio a estereótipos sobre mecânicos, mulheres que posam pra playboy e organizadores de casamento. Vergonhoso.
fantastic…
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