Em 1995, uma mulher resolveu limpar sua vida dos excessos ao caminhar a trilha PCT (Pacific Crest Trail). Em 2014, Reese Witherspoon interpretou essa pessoa depois de alguns eventos que a fizeram sair dos focos dos holofotes. A estratégia pode render o Globo de Ouro para a atriz, mas será que o filme está à altura dela?
Cheryl Strayed (Witherspoon) segue a trilha PCT que, com 1100 milhas (aproximadamente 1760 quilometros), se inicia próximo à fronteira dos Estados Unidos com o México e termina próximo ao Canadá. Ela não tem treinamento para caminhadas do tipo e não entende muito sobre o que tenta realizar, mas tem motivos pessoais fortes para a jornada. É um drama complexo sobre uma mulher real e, justamente por isso, não tem medo de esconder os defeitos da própria.
O trunfo se encontra no fato de que, apesar das diversas escolhas e atitudes destrutivas e condenáveis de Cheryl, o filme ainda consegue torná-la carismática para o espectador. Parte por conta do roteiro de Nick Hornby, adaptado do livro escrito pela pessoa real. Como na maioria das histórias do famoso autor, Livre acompanha uma pessoa que cometeu muitos erros decorrentes de diversas justificativas. O talento de Hornby é conferir humanidade para os raciocínios de seus protagonistas através da lógica por trás de pensamentos e atos. Enquanto ele detalha a viagem da personagem, faz flashbacks dos motivos pelos quais se meteu naquela aventura. Parte dos motivos são decorrentes de erros dela. Outra parte de tragédias além do controle da mesma. Muitas vezes, os erros se dão por conta de problemas para lidar com as tragédias. E algumas tragédias são consequências de erros. Os defeitos de Cheryl, por piores que sejam, são compreensíveis.
Cheryl com o ex-marido. Erros e tragédias correlacionados.
O diretor Jean-Marc Vallée, o mesmo de Clube de Compras Dallas, sabe explorar melodrama. Apesar de manter o tom de seriedade, os múltiplos problemas da vida de Cheryl nunca caem no ridículo do exagero. Mesmo que muitas vezes as cenas sejam feitas com longos planos de baixa velocidade e músicas desnecessariamente tristes. O êxito se dá mais por conta da excelente montagem que por conta das escolhas dos planos. Os cortes ligam o passado com o presente através de pequenas conexões de objetos na trilha que fazem com que Cheryl se lembre das situações prévias e o espectador acompanhe o raciocínio que liga as memórias dela. Um dos melhores é quando lembra porque fez a tatuagem que carrega no braço.
O outro grande motivo pelo qual Cheryl consegue ser carismática é a Reese Witherspoon. O sofrimento da personagem é visivelmente expresso pela atriz, mesmo enquanto ela comete os erros. Fica claro que Cheryl faz suas escolhas como forma de fuga do sofrimento. Mesmo durante a caminhada a tristeza é uma constante. A Laura Dern representa a mãe da personagem e sabe como representar o carinho que faz com que ela seja tão querida para a filha.
Livre é sobre limpeza da alma, culpa e superação. É um drama envolvente sobre uma situação real única e com originalidade para a abordagem dos temas que retrata. Próximo ao final, fica um pouco cansativo por conta de um excesso da narrativa da personagem em off. O ritmo bem conduzido e a forma como os eventos são bem escritos ainda mantêm o valor do filme e garantem um saldo positivo.
ALLONS-YYYYYYY…