Luc Besson lança seu filme anual obrigatório. Depois do excelente A Família ano passado, quando brincou de filme de máfia com o Robert de Niro e o Martin Scorsese, ele resolveu ficar um pouco mais conceitual. Lucy é a chance do diretor de fazer uma ficção-científica fantástica recheada de conceitos filosóficos e muito de seu estilo pessoal. Ah, sim. Tem a Scarlett Johansson também.
Lucy (Johansson) é uma estudante americana fazendo intercâmbio em Taiwan. Um dia acompanha um ficante até uma entrega e subitamente se vê sequestrada por uma gangue de tráfico de drogas que pretende usá-la como mula. No processo, porém, nega sexo a um dos bandidos e sofre uma agressão, que estoura o saco com os químicos em seu corpo. A droga recém-criada faz com que Lucy use mais partes do cérebro. O que vai despertar poderes e possibilidades.
O filme usa de pseudociência para poder brincar com conceitos filosóficos. Ao mesmo tempo, Besson faz da jornada de transformação de Lucy um exercício de estilo pessoal. Trata-se então de uma ficção-científica filosófica, com ação, tiroteios, perseguições de carro e montagem de videoclipe.
Luc Besson dirige e roteiriza o filme com seu habitual ritmo acelerado. Todo o absurdo contexto científico do filme é apenas um pretexto para discutir existência e valores relacionados a vida e morte. O problema é que ele leva a sério todas as besteiras que usa para contextualizar. Tanto que coloca um personagem de um cientista fazendo palestra sobre o tópico e afirmando que estuda o potencial do cérebro a décadas. Sendo que qualquer um que estudasse por alguns minutos saberia que é ilógico. Daí ele desenvolve todo o filme através de outras teorias científicas que também são baboseiras e que quebram a sensação de realidade da produção.
Lucy com um cientista. Pra quê pesquisar antes de escrever o roteiro, né?
Sem contar, é claro, que a parte filosófica é superficial feito uma folha de papel. Os questionamentos sobre realidade, existência e universo que Lucy vai se fazendo à medida em que começa a ter controle e conhecimento sobre tudo são interessantes. Mas diante dos milhares de anos de estudos sobre filosofia, as supostas respostas que ela encontra parecem apenas tolas. Principalmente a resposta final sobre unidade que é simplesmente uma afronta à inteligência alheia.
Se em termos de discussão o filme é uma grande falácia, é na área de diversão que ele acerta. Besson filma tudo com closes e planos detalhes em meio a cortes rápidos. O ritmo parece muito o de Corra, Lola, Corra. Principalmente com algumas excelentes escolhas de montagem. A primeira cena é sobreposta a imagens de animais sendo caçados por seus predadores. Em paralelo à própria captura de Lucy pelos criminosos, compara a condição inicial da protagonista à de seres primitivos. Enquanto o potencial cerebral de Lucy desenvolve, Besson cria suspense ao revelar vilões, bandidos e polícia em seu caminho. O suspense não se dá por causar medo pela Lucy, mas pela curiosidade sobre o que ela pode fazer. O que é bom e ruim ao mesmo tempo.
Sem o receio pela vida dela, o espectador já sabe que ela vai conseguir o que quer. Não há um conflito real. Por outro lado, a curiosidade sobre os poderes e o que vai ser dela sustentam muito bem e tornam a produção divertida. Lucy pega um carro e precisa atravessar a cidade rapidamente. É divertido vê-la desviando de trânsito, carros, acidentes ao mesmo tempo em que faz com que todos ao seu redor saiam de cena sem esforço. Não há suspense, apenas uma graça em ver como ela é poderosa.
A fotografia começa com simulação de luzes incandescentes coloridas, que somadas ao mundo da Lucy comum revelam o padrão baixo de vida no qual ela vive como humana normal. Quanto mais ela evolui, mais as luzes e a arte vão ficando limpas, até chegar ao ápice da evolução humana, como Besson teoriza com seu final apoteótico e visual. Não faz muito sentido, mas quem se importa em um momento tão bem construído e maluco. É como se perder em uma ilusão contagiante e bizarra.
Lucy quica pelo cenário. Exercício de estilo do Luc Besson.
Acho que é o quinto ou sexto filme com a Scarlett Johansson só neste ano. E mais uma vez ela está ótima, indo do impávido de uma entidade avançada para pequenos momentos emotivos e belos. O Morgan Freeman está no automático, como o faz já a algum tempo. De resto ninguém é conhecido nem merece ser mencionado.
Lucy é uma loucura sem sentido cujo roteiro remete, acidentalmente ou não, a Akira. Não é nem de longe tão bom e profundo quanto a animação japonesa, mas é divertido dentro de sua insensatez. É uma demonstração de como o estilo de filme do Luc Besson serve mais para tom que para roteiro.
GERÔNIMOOOOOOOOO…
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