Alguém lembra do péssimo O Coronel e o Lobisomem, que foi na época a produção mais cara da história do Brasil devido aos efeitos digitais? Esta releitura do personagem tradicional Pedro Malasartes repete a mesma promessa ao ser lançado como a maior quantidade de efeitos especiais em um filme brasileiro.
Nesta versão, a Morte (Júlio Andrade) apadrinha Pedro Malasartes (Jesuíta Barbosa) como parte de um plano para que ele a substitua na função de levar as pessoas que morrem para o além. No aniversário de 21 anos, o afilhado recebe de presente o poder de impedir três vezes a morte de alguém.
Para quem não sabe, o personagem do título foi importado para o Brasil da cultura portuguesa e espanhola, mas já apareceu até em contos alemães. Tradicionalmente, ele é um malandro que vive de passar a perna nos outros e é considerado, pelo menos neste filme, como o homem mais inteligente do mundo.
É preciso reconhecer o trunfo de Paulo Morelli, diretor e roteirista do filme, ao misturar estilo e estética da cultura nordestina com temas da mitologia grega, como as parcas que tecem o destino (lideradas aqui pela veterana Vera Holtz). Além de acertar ao resgatar um personagem tradicional esquecido pela cultura popular.
Normalmente, roteiristas fazem personagens que são “mais inteligentes que todo o mundo na trama” com pequenas trapaças narrativas preguiçosas. Como apenas criar coadjuvantes que são burros demais para notar os esquemas do protagonista. Ou, pior ainda, repetir constantemente que foi inteligência, mas não conseguir escrever essa esperteza na história.
Infelizmente, são exatamente os dois pecados que Morelli comete. Os diversos personagens fantásticos repetem inúmeras vezes que Malasartes é mais inteligente que todo o mundo, mas durante o filme inteiro, ele só consegue trapacear uma pessoa. E justamente o personagem mais burro da história. De resto, todos os esquemas do protagonista dão errado e não são realmente inteligentes.
Morelli também errou terrivelmente ao convocar o Leandro Hassum para ser o grande alívio cômico da produção. O comediante nunca teve graça, e não aprendeu antes de trabalhar neste filme. Com caretas gratuitas e grunhidos estridentes, ele faz com que as cenas em que aparece sejam constrangedoras. De resto, o humor se resume a estereótipos do caipira matuto.
E as grandes promessas dos efeitos especiais são vazias. Em grande parte porque Morelli se resume ao estilo Globo Filmes de filmar temas nordestinos com estética de teatro. Quando a péssima computação gráfica aparece, ela é ligada a cenas feitas em cenários que parecem palcos, e não sets.
O elenco, porém, é ótimo. Emprestados diretamente de uma das maiores emissoras e produtoras de TV do país, são atores carimbados em interpretações teatrais que condizem com a estética que Morelli segue. Mas ninguém se destaca, nem mesmo excelentes atores de cinema como o Júlio Andrade, a Isis Valverde ou o Milhem Cortaz.
Talvez a maior tristeza relacionada com este filme seja o desperdício de um personagem tradicional que merece ser relembrado pela cultura popular. Também é uma pena que a nova produção do diretor do excelente Entre Nós seja essa obra capenga. Melhor se apegar aos textos do Pedro Bandeira ou procurar a versão do Mazzaropi, de 1960.