Assistir ao trailer de O Conselheiro do Crime passa a impressão errada. Todo o material de marketing foca no elenco incrível e no diretor. E o tom passado é o de um filme de crime e ação com cores fortes e quentes. Mas o que pouco se notou é que se trata de uma obra do mesmo autor de Onde os Fracos Não tem Vez. O que é muito importante porque, mais do que um filme do Ridley Scott com aquele elenco, O Conselheiro do Crime é uma história do Cormac McCarthy.
Como em tudo de McCarthy, a história não é realmente importante. Não é sobre um advogado rico que tem problemas financeiros e por isso se envolve com o tráfico boliviano. O que importa é como os atos e ações dos personagens representam as múltiplas analogias que McCarthy quer construir.
Para quem não conhece o autor e não assistiu Onde os Fracos Não tem Vez, recomendo fortemente assistir antes de ver este O Conselheiro do Crime. Muita gente não gosta de como aquele termina.
Mas esse é o negócio, tal qual o outro filme, O Conselheiro do Crime tem um fim. Mas não é o típico final satisfatório que estamos acostumados a assistir. McCarthy faz acompanhar de forma bastante fria e detalhada cada pequeno passo do pesadelo em que o advogado vivido por Michael Fassbender passa.
É o primeiro envolvimento dele com o crime e, de acordo com ele, vai ser o último. A cada passo de sua participação encontra novas figuras. O amigo antigo vivido pelo Javier Bardem, um desconhecido de fala mansa com as feições do Brad Pitt. Todo mundo aconselhando diversas coisas que remetem sempre a uma mesma lógica, não se envolva com o tráfico.
O título nacional, por sinal, é um erro absurdo. O personagem de Fassbender é chamado apenas de Counselor em inglês, expressão usada para advogados. Ele aconselha, mas seus clientes, nunca o crime organizado. O nome do filme no original é The Counselor para criar uma ironia. Apesar de ser “o aconselhador”, o personagem passa o filme inteiro recebendo conselhos devido a sua condição de inocência em relação ao que está se metendo.
É um filme de diálogos filosóficos e significativos. Cada aviso que o advogado recebe é um reflexo do que vai acontecer até o final. O que é genial. Os personagens vão descrevendo como vai ser o próprio fim. Seja através da descrição de uma arma ou com uma figura do passado que explica o que acontece com todos que se aproximam de tal personagem. Fica um tom constante de prenúncio do mal relacionado ao envolvimento com o cartel.
McCarthy faz metáforas ligando sexo e mulheres ao mal, a vícios e ao poder. Abre com uma cena de sexo. Grande parte das conversas são sobre sexo e mulheres. Mas essas falas servem para refletir o mal no nível de sujeira ao qual as pessoas se permitem chegar quanto a sexualidade. Um diálogo hilário chega a comparar a vagina com um peixe em uma cena que fica no limite entre o bizarro e o assustador. Ao final temos um discurso fascinante sobre o animal humano e como seus hábitos predatórios são catastróficos.
O mérito do escritor é alto porque o filme não é mais uma adaptação de um livro seu. O roteiro é original e escrito por ele. Mas Ridley Scott não deve ser esquecido. O diretor faz escolhas maravilhosas, cumprindo sua função como não fazia a algum tempo. Coloca analogias visuais de diferentes tipos e constrói o clima quente do tráfico com cores quentes e caracterizações que vão do bizarro ao extremo elegante.
O Javier Bardem parece que teve uma granada explodida na sua cara. Está com a pele toda queimada e o cabelo arrepiado. A Cameron Diaz usa roupas elegantes com cores berrantes. O Brad Pitt faz o tipo de personagem que melhor combina com ele, com cabelos compridos e riso zombeteiro. A elegância fica por conta de Fassbender, que parece um certo agente britânico com seus ternos finos e carros caros.
O destaque das interpretações fica, surpreendentemente, por conta da Cameron Diaz. Ela faz uma vilã assustadora, que consegue roubar a cena até do sempre excelente Bardem. Todos estão ótimos, mas o filme é dela.
No final das contas, O Conselheiro do Crime é um dos grandes filmes do ano.
FANTASTIC…