Célestine (Léa Seydoux) é uma camareira da França do final do século 19 que arruma emprego na casa dos Lanlaire. Enquanto desenvolve uma estranha relação com o faz-tudo da casa, Joseph (Vincent Lindon), ela relembra os empregos anteriores e reflete sobre os valores e costumes da sociedade francesa durante o infame caso Dreyfus, que marcou a história do país.
Releitura da obra homônima de Octave Mirbeau escrita de forma serializada durante os anos 1891 e 1892, esta versão de O Diário de uma Camareira é a quarta adaptação dos contos sobre Célestine para o cinema. Dos filmes anteriores, o mais marcante é o dirigido por Luis Buñuel em 1964. Assim como o alterego literário, esta produção se propõe a discutir as relações de trabalhadores domésticos com patrões ricos ao mesmo tempo em que dá voz para as questões políticas que podem ter conduzido ao antissemitismo europeu do início do século 20.
Todos estes méritos são diretamente da obra original, pensada em uma cadência diferente, uma vez que foi publicada aos poucos. Para um filme, o roteirista e diretor Benoît Jacquot reduziu os flashbacks de Célestine para dois. Um deles retém a parte mais divertida da produção, quando ela cuidava do neto doente de uma senhora idosa. Entre os jogos de poder de patrões e empregados dentro das casas, Célestine questiona valores da sociedade até chegar ao extremo do antissemitismo.
Joseph e Célestine. Relação baseada no ódio e no preconceito.
O problema principal é que a trama central, na casa dos Lanlaire, é chata. Os resmungos ditos entre dentes fechados da protagonista e as ironias da vida vazia da patroa desgastam rápido. Rapidamente ela desenvolve um estranho interesse pelo bruto e grosso faz-tudo da propriedade, Joseph. Com cara de revolta política, os discursos dele refletem os pensamentos radicais de quem não era a favor das condições e culpa uma cultura inteira pelos problemas. No caso dos dois, a culpa é dos judeus.
Jacquot tenta usar luz ambiente para a iluminação e, com frequência, deixa com que raios de Sol estourem na película. O tom que reina é o dourado, com uma direção de arte belíssima que reflete as riquezas dos mundos pelos quais Célestine passa. A ironia se encontra em como retrata esta beleza do ponto de vista daqueles mais próximos da sujeira da mesma.
Com o moribundo Georges. Carinho que surge da inocência.
A Léa Seydoux dispensa elogios. Excelente atriz, ela não precisa de vaidade para se meter em cenas que brincam com conceitos grotescos relacionados ao corpo dela. Uma é das cenas de sexo mais interessantes e divertidas do ano. Vincent Lindon se destaca em relação ao resto do elenco, mas não faz muito.
Ao término, é um quadro novo, porém desnecessário de uma obra clássica. Uma das regras que deveriam ser seguidas no cinema é, não faça remake de clássicos ou de filmes de diretores como o Luis Buñuel. Ainda é válido pela extraordinária cena de sexo que termina em morte e pela beleza de Léa. Pelo menos a discussão se mantém atual em comparação com filmes como Que Horas Ela Volta? e Casa Grande.
FANTASTIC…