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O Nascimento de uma Nação (The Birth of a Nation – 2016)

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O Nascimento de uma Nação de 2016 chega cercado de polêmicas desde o título. Um dos filmes mais importantes para a história da linguagem cinematográfica foi feito há 101 anos, com o mesmo nome. Com um porém: aquele fazia adoração ao racismo e este faz repúdio. Apenas por isso já desperta interesse. Somado às inúmeras discussões sobre as escolhas do diretor/ator/roteirista/produtor Nate Parker, que também deram o que falar, a produção se tornou um dos grandes debates prometidos pra temporada de premiações do ano que vem.

A história do protagonista Nat Turner (Parker) é real. Escravo alfabetizado durante a época do sistema escravocrata estadunidense, se tornou um pregador cristão devoto. Durante a vida, constituiu família e fez sermões para outras pessoas escravizadas. A jornada o levou a liderar uma das maiores rebeliões contra os brancos.

A proposta é interessante e justa. Boas histórias merecem ser contadas, e a de Nat Turner certamente tem potencial para um extraordinário filme. Contos de oprimidos que se rebelam são fascinantes. Especialmente em um dos contextos mais revoltantes da humanidade. A dúvida principal aqui é se Nate Parker é capaz de fazer isso no filme de estreia dele.

Como roteirista, ele não faz um bom trabalho. Parece realmente acreditar que Nat era um enviado divino na Terra. A primeira cena é sobre uma profecia que mostra ele como um escolhido. A previsão é feita por meio de uma religião africana. Mais tarde, como pregador e líder rebelde, ele é retratado como um representante de Deus com uma missão.

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Escravatura americana. Horror pungente em cada cena.

Além da incoerência religiosa, o discurso dele como pastor muda da aceitação para falar de justiça divina. Algo que na Bíblia muitas vezes se revela como vingança e sanguinolência. É justamente o que acontece em O Nascimento de uma Nação. Entre a promessa de Nat de que as mortes são feitas unicamente pela libertação, o roteiro cria momentos nos quais alguns personagens ganham uma vingança. Um personagem consegue matar o homem que estuprou a esposa, outro consegue matar o antigo senhor e por aí vai. De certa forma, o filme parece querer ser uma catarse niilista. O que certamente não condiz com a religião.

O texto também falha em mostrar a realidade da escravidão. Nat cresceu no sistema, mas parece só perceber a realidade quando é forçado a viajar por outras fazendas e descobrir os horrores que outros sofriam. Então, convenientemente, ele também passa a sofrê-los.

Onde Parker acerta de verdade é na direção. Se o texto apresenta muitos problemas, a parte técnica é quase impecável. A fotografia de Elliot Davis é linda e significativa. Ele apresenta os cenários belos do sul dos Estados Unidos com belos movimentos de câmera, que parecem flutuar entre plantações de algodão, casas artesanais e fazendas. Em meio à beleza, aparecem pontualmente figuras presas no horror da escravidão.

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Nat com o “dono”, Samuel. Abusos pontuais que se tornam culpa.

A montagem usa sons altos e repentinos para extrapolar a tensão de cada contexto. Em uma cena primorosa, um dos escravos apara a barba do “dono” Samuel (Armie Hammer) com uma tesoura. Parker filma a lâmina sempre próxima ao pescoço para dar a impressão de que os personagens precisam se segurar contra o impulso de matar o homem que os prende. Então o som do fechar da tesoura marca a transição para outra cena.

Parker também sabe criar pequenas analogias visuais em cada situação. Numa, o sangue de Nat preenche um dos algodões que ele deve colher. Simboliza as vidas gastas na produção do tecido. Em outra, uma inclinação de velas representa a vontade de dois personagens de se aproximarem.

Os atores são ótimos. Com destaque para Parker, que consegue dar ao melodrama retratado uma performance convincente. Ele sofre, e é possível ver apenas na forma como mexe os lábios para reter o choro porque está triste. Melhor do que ele, apenas Armie Hammer. Grandalhão de queixo quadrado, ele tem um pequeno ciclo próprio no qual o personagem afunda cada vez mais no alcoolismo para conseguir lidar com a culpa do que faz o escravo passar. Inclusive, é justamente porque ele consegue dar carisma para o escravagista que não é possível solidarizar com a vontade de matar do protagonista.

Ao término, O Nascimento de uma Nação é um filme misto. A qualidade de linguagem visual e técnica parece gasta em um roteiro melodramático feito mais para tentar fazer chorar que para retratar algo. Vale pelo espetáculo e não pelo conteúdo, que não é pobre, mas é comprometido por uma necessidade de fazer um grande épico de escala divina.

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