Imagino a primeira reunião dos atores Jeff Bridges, Julianne Moore, Olivia Williams e Djimon Houston com o diretor Sergey Bodrov na primeira leitura do roteiro deste O Sétimo Filho. A indicação dele para prepará-los provavelmente foi “Assistam Caça às Bruxas e prestem atenção ao que Nicolas Cage faz ali. É o que quero para meu filme.”. A cena descrita nunca aconteceu, mas é assustador como O Sétimo Filho se assemelha ao filme em que o careca confronta uma feiticeira aliada com o diabo.
Tom Ward (Barnes) é o sétimo filho de um sétimo filho, o que faz dele um homem mais forte e adequado para lidar com as forças sobrenaturais. Ele é buscado pelo mestre Gregory (Bridges) para ser treinado, mas o veterano precisa acelerar os ensinamentos porque a bruxa Mãe Malkin (Moore) se libertou do aprisionamento e pretende acabar com os humanos. Os dois não sabem que existe mais na herança de Tom que a mãe dele (Williams) escondeu e que pode ser a chave para a empreitada.
Impossível não estabelecer aqui a óbvia jornada do herói. Mentor, antagonista, força secreta, aliados, inimigos e tudo o mais. A diferença é que ela está adaptada para um fantasia medieval que se serve fortemente de características de RPGs de mesa e muitas referências à cultura hindu. Poderia ser uma ideia interessante para explorar no cinema, mas o roteiro cria situações que não condizem com a mitologia apresentada e dá falas inúteis que servem para expor ideias idiotas, como dar grau de perigo para as entidades fantásticas enfrentadas, ou para serem frases de efeito.
Reviravolta romântica interessante do livro vira rapidamente “mocinha em perigo”.
À princípio, Tom quase não acredita nas coisas que Gregory diz existir no mundo, mas elas pulam na cara dele constantemente, sem que os dois as procurem. Como alguém não sabe que fantasmas existem se eles rondam florestas a olhos vistos ou se monstros gigantes e indestrutíveis simplesmente saltam do chão em meio a estradas? No encontro com o espírito, Tom escuta do mestre que não deve se preocupar com a aparição pois se trata de um inimigo de nível 6. Como um nerd empolgado demais que tenta descrever o mundo mais do que o espectador jamais teve interesse em descobrir. Gregory nunca para de gritar piadas sem graça ou frases que deveriam ser únicas e potentes. O problema é que o esforço de ser legal fica evidente e a tentativa soa apenas como boba.
O filme tenta conseguir uma nova franquia de sucesso adaptado de literatura fantástica. Desta vez, o material original é a chamada As Aventuras do Caça-Feitiço (The Wardstone Chronicles), série de treze livros com os mesmos personagens que dão as caras no filme. O primeiro, O Aprendiz (The Spook’s Apprentice) é a base para a produção. Com a diferença de que muitos elementos da mitologia e da própria história são alterados. Apenas por isso não é um problema. A complicação se encontra em trocar por coisas que não fazem sentido. Por exemplo, apenas pessoas especiais como Tom e Gregory conseguem ver as criaturas fantásticas no livro. O que explica como as pessoas não sabem dos bichos no mundo. Na versão de cinema, qualquer um pode ver qualquer coisa. O que gera cenas sem sentido como o bicho que sai do chão.
Com essa vontade de fazer algo com potencial para continuações, o estúdio jogou dinheiro e profissionais em cima do realizador. Nomes como Marco Beltrami (compositor), Thomas Tull (produtor) e John Dykstra (efeitos especiais) dão brilho para O Sétimo Filho. A fotografia é linda com uma névoa opressora que esconde aquele mundo de magia; a palheta de cores é rica com o colorido das tendas, roupas e mitologias hindus; o design de produção é inspirado com a mistura de seres mágicos como dragões com deuses como Vishnu; a trilha sonora ecoa com tambores fortes e temas de sopro dignos de cavalarias; os efeitos especiais possuem texturas detalhadas e realmente parecem reais; até o 3D estereoscópico funciona muito bem.
“Eu não queria que esse fosse meu primeiro filme lançado depois de ganhar o Oscar.”
Nada disso adianta quando o comandante por trás de tudo é alguém como Sergey Bodrov. O diretor poderia usar de toda essa qualidade técnica para criar uma ambientação que envolve, mas apenas filma a história ao invés de contá-la. Os atores se reúnem no cenário e dizem os diálogos como se fosse uma peça. Bodrov coloca as câmeras em ângulos que pegam toda a ação. Os atores provavelmente pediam para fazer mais takes por querer melhorar a interpretação e ele apenas respondia que estava bom como ficou e seguia adiante. Para aproveitar o efeito 3D, faz cortes com montes de objetos, golpes e criaturas que voam da tela na cara do espectador, sem exploração de profundidade. Parece um trem fantasma. Somado ao péssimo roteiro e à terrível montagem (que provavelmente contou com mão do estúdio), Bodrov praticamente arruinou o próprio filme.
O universo interessante com visuais bacanas e grandes cenas de ação deve satisfazer os adolescentes que adoram livros e jogos de fantasias. A falta de qualidade no conteúdo, os problemas de ritmo, a incoerência do roteiro, as interpretações afetadas e os péssimos diálogos impedem alguém que busca um pouco mais de aproveitar a projeção. Prêmio Nicolas Cage do mês.
ALLONS-YYYYYYYYYY…
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