Crítica por Zilta Marinho.
Produzido na década de 1980, ainda durante o governo militar, “Os anos JK – Uma Trajetória Política” retrata a vida de Juscelino Kubitschek desde o governo Vargas até a morte em setembro de 1976. Com fotos e filmes originais das diversas épocas representadas, Silvio Tendler transporta o público no tempo com a trajetória de um dos políticos mais importantes na história do país.
O material escolhido por meio da rica pesquisa em acervos de jornais, emissoras de TV e cinematecas enriquece o documentário, e ilustra entrevistas com personalidades que conviveram com Juscelino em depoimentos dados anos depois dos fatos ocorridos. Sem a paixão do momento, expressivos nomes da política nacional fazem, em seus comentários, reflexões sobre os bastidores de momentos tensos e até dramáticos de nossa história. Dentre esses personagens estão Tancredo Neves, o Marechal Henrique Lott, Magalhães Pinto, Juracy Magalhães, Dante Pellacani e Marcos Heuzi.
A narrativa apresenta uma cronologia, embora vá e volte nos acontecimentos conforme o momento representado. O uso de fotos e filmes originais em preto e branco, assim como a qualidade dos sons originais, reforça a ideia de evolução, de desenvolvimento, que também reflete o trabalho de Juscelino para o alcance de metas. O desafio de levar a capital para o interior e de construí-la em poucos anos é apresentado juntamente com a habilidade política do protagonista para resolver conflitos.
A locução em off com voz solene de Othon Bastos narra fatos marcantes da vida política brasileira, como os governos de Getúlio Vargas e o suicídio em 1954; os governantes que o sucederam; as manobras de Lott para a preservação da democracia para que Juscelino assumisse a presidência, apesar de ter obtido apenas 36% dos votos na eleição. O documentário oferece, assim, a oportunidade de entrar em contato com informações que muitos brasileiros não conheceram.
Silvio Tendler. Uma ideia e uma câmera na mão.
O fato de Tendler trazer a história dos governos que sucederam o de Juscelino – como o de Jânio Quadros, João Goulart e os militares após 1964 – prepara o espectador para compreender melhor os fatos que envolvem a cassação, o exílio e a mística em torno da morte de Kubitschek. Os filmes originais trazem a moda, os costumes, as marchinhas e os lemas das campanhas políticas dos períodos narrados por Bastos. Da família de Juscelino, pouco é mostrado. A figura constante é a da esposa Sarah, que o acompanhou em toda a jornada.
O documentário foi realizado num momento em que o Brasil também convivia com uma certa expectativa em torno da política. No início dos anos 1980, ambicionava-se o fim do regime militar e a volta à sonhada normalidade democrática. Nas ruas, manifestações por eleições diretas ecoavam, e o governo do General Figueiredo encerrava um ciclo. O atual momento político brasileiro, guardadas as devidas proporções no tempo e no espaço, tem semelhanças com as lutas representadas em “Os Anos JK”. Quis a vida que Tancredo Neves, o primeiro presidente eleito (mesmo de forma indireta), fosse exatamente um dos personagens importantes da história de Juscelino.
Ao representar a força dos anos 1950, com o mundo em reconstrução no período após a Segunda Guerra, o filme reflete ainda a garra, a elegância e o carisma de Juscelino. A narrativa atrai a atenção dos mais velhos, que viveram essa época. Mas também desperta a curiosidade dos mais novos, que vivem o momento pós-impeachment e também lutam, à sua maneira, para preservar a democracia.