Para Sempre Alice é um filme complicado pois trata de uma das condições mais cruéis pela qual uma pessoa pode passar. O Alzheimer é uma doença degenerativa que destitui a pessoa de suas capacidade cerebrais e, até certo ponto, de si mesma. A complicação se encontra no fato de que um filme desses pode facilmente cair no melodrama gratuito.
Alice Howland (Moore) é uma brilhante professora teórica de linguística que descobre que tem um tipo raro do mal de Alzheimer. Ciente do que vai acontecer com o passar do tempo, ela toma as medidas necessárias para os cuidados do futuro da família e de si mesma. É, de forma bem simples, um filme que acompanha aos poucos o processo de perda da pessoa que perde a memória de tudo o que conhece, fez e é.
O roteiro de Richard Glatzer e Wash Westmoreland (também são os diretores do filme), adaptado do livro homônimo de Lisa Genova, coloca o espectador em cada cena de forma que ele descobre os contextos da mesma à medida em que ela acontece. Faz muito sentido porque cria uma desorientação muito semelhante à da própria Alice. Este recurso também leva a algo muito positivo: o espectador não é tratado como um imbecil. Ele precisa prestar atenção nas falas e nas atuações para tirar os detalhes apropriados para compreender a trama. Os diálogos dão as dicas de tudo o que é importante para essa compreensão, mas sem ser expositivo. Ninguém fala sobre as relações entre os familiares de Alicia, mas eles são complexos e diferentes entre si. Essas conexões são feitas através de reações entre eles.
Relações elaboradas com sutileza e detalhes.
Sabe-se que a irmã mais velha, Anna (Bosworth), é orgulhosa pelos comentários sarcásticos e reprovadores que direciona aos dois mais novos. O do meio, Tom (Parrish) aparece sozinho em um jantar e diz que terminou com a namorada, Anna o olha com desdém e alfineta: “Outra vez?”. Também se conhece um pouco mais sobre ele, que mais tarde aparece mais vezes com companheiras diferentes. Não precisa explicar, já se sabe que ele é um namorador que não gosta de compromisso. Quando a irmã mais nova, Lydia (Stewart), comenta o que percebeu sobre a doença da mãe com leviandade, Anna lhe dá bronca por ser insensível. O que demonstra que a própria Anna sofre de alguma insensibilidade em relação a como desaprova a caçula e que Lydia não é muito madura. O marido, John (Baldwin), é a figura paterna que une todos, mas não consegue esconder o desespero de ver a esposa sumir dentro de si. Em certos níveis, ele sofre mais com a condição que Alice.
Tudo isso funciona porque o elenco está afiado. Se Julianne Moore mereceu o Oscar pelo retrato da mulher que passa apenas a ser o casco do indivíduo que existia ali dentro, o resto não fica ofuscado. Alec Baldwin parece manter a calma, mas o olhar sempre deixa escapar o horror escondido. Kate Bosworth está radiante como mãe de família realizada que lança alguns olhares de desdém incômodos. Hunter Parrish é o elo fraco, não surpreende ser justamente o integrante sem fama. Kristen Stewart dá para Lydia o nível necessário de rebeldia e compreensão que falta ao resto dos parentes da trama. Ela, junto com Baldwin, é dona da cena mais comovente.
Marido normalmente calmo não consegue esconder o desespero.
Os diretores acertam em filmar a confusão de Alice com focos profundos. Ela está perdida porque esqueceu o local em que se encontra ou outra coisa do tipo, e como o espectador não vê além dela, também perde o senso de espaço. Quando os parentes dela sofrem ao encontrá-la perdida, o acerto está em apenas dar destaque para os ótimos atores. O filme é feito dos momentos íntimos, nos diálogos sutis e nas pequenas coisas não ditas que são passadas pelos detalhes das interpretações, o que revela dois grandes diretores de atores.
Tanta sutileza e coisas escondidas nas entrelinhas garantem um filme que não cai na obviedade do melodrama. Todos sofrem, mas isso não é motivo para que chorem pelos cantos com falas bobas que riscam alguma profundidade. Entretanto, como alguém que testemunhou o decaimento de uma pessoa para o Alzheimer, posso dizer que as reações não exageradas dos familiares são verossímeis.
ALLONS-YYYYYYY…
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