Entre as décadas de 1950 e 1960, a Itália explodiu em produção de cinema. Tudo que era produzido por lá era mais cru, mais seco e, justamente por uma falta de habilidade técnica, mais verossímil. Disso saíram coisas como os movimentos Giallo e o Western Spaghetti, que ficou conhecido por aqui como bang-bang a italiana. Por uns Dólares a Mais foi um dos principais expoentes do estilo.
Os caçadores de recompensa Manco (Clint Eastwood) e coronel Douglas Mortimer (Lee Van Cleef) vão para a cidade de El Paso, que contém um dos bancos mais seguros do país porque sabem que o bandido El Indio (Gian Maria Volontè) e o bando dele pretendem roubar o lugar. Como caçadores de recompensa rivais, eles precisam estabelecer um acordo antes que matem um ao outro.
Segundo título da famosa trilogia do dólar, também conhecida como a trilogia do homem sem nome, Por uns Dólares a Mais foi uma ressurgência do ator Lee Van Cleef depois de alguns anos sem fazer faroestes. Na linha dos faroestes do diretor Sergio Leone, o filme segue a premissa de construir uma história que conduz a um duelo final. Um grande conflito no qual o espectador deve torcer por um homem e sentir a tensão do medo pela vida dele.
Para realizá-lo, Leone faz mais um dos grandes vilões dos faroestes dele. El Indio é, na falta de termos melhores, mau feito o pica-pau. O nível de sadismo do personagem cria a vontade instantânea no espectador de vê-lo capturado pela dupla improvável de caçadores. Para criar simpatia pelos dois, o realizador os faz inteligentes, irônicos e capazes. Vê-los em ação é divertido, e como ambos demonstram constantemente pistas sutis de moralidade, não há culpa quando se torce por eles após qualquer um cometer uma matança.
El Indio. Sadismo e insanidade compõem um grande vilão.
Cada um dos três personagens ganha algo como um curta-metragem que os apresenta. O do Coronel demonstra a religiosidade do personagem, assim como a disciplina que é o diferencial dele como caçador. Manco aparece em seguida com planos detalhes que seguem para virar belos planos médios. As tomadas apresentam o porquê do apelido do homem, a velocidade dele e as habilidades apesar do problema físico. Por fim, Indio se vinga do último homem que o prendeu com uma maldade dirigida. Mata a família do inimigo apenas para que este tenha ódio dele antes de morrer.
A história é contada através das imagens na tela. Quando as falas aparecem, elas são impactantes e dão complemento. Na apresentação de Indio, os capangas levam a família do homem que ele quer maltratar para fora e escuta-se os tiros. Ele solta o homem, entrega uma arma para ele e diz: “Agora você está com raiva o bastante”. É o pouco de informação para compreender o sadismo do personagem em causar o sofrimento. Tudo muito bem pensado pelo próprio Leone com o outro roteirista, Luciano Vincenzoni.
O diretor gosta de explorar tensão. Com enquadramentos grandiosos mesmo em ambientes fechados e apertados, faz com que as cenas demorem para escalar até a violência comum dos filmes dele. Isso se dá principalmente nos duelos. Longos takes de closes em olhos, de personagens colocados a grandes distâncias, de planos abertos que os colocam nos cenários enormes dos desertos da Espanha. Os tempos são preenchidos com a extraordinária música do compositor Ennio Morricone. Aqui ele usa um objeto importante para o enredo, um relógio de bolso que toca uma música de corda. Ele dá o tema para o conflito final e faz com que o grande duelo seja ainda mais pessoal. Subitamente a música diminui e em poucos segundos uma explosão de tiros termina com morte. Rapidamente, a tensão vira um suspiro de alívio ou de ódio pelo que ocorreu na tela.
Van Cleef como o coronel Mortimer. Inteligência e paciência.
Clint Eastwood está ótimo como o sujeito que surge de lugar nenhum e parte para outro nada, mas resolve tudo com silêncio e olhares perspicazes. Foi inspiração para grande parte dos brucutus do cinema, mas nenhum consegue ser tão bom quanto ele. Van Cleef dá para o coronel Mortimer uma dose de cansaço acumulado com o passar dos anos. Ao mesmo tempo, o personagem é o mais inteligente e o mais paciente da fita. Quando é revelado a verdade sobre o passado dele, é impossível não torcer quase que exclusivamente por Mortimer. Volontè também brilha como El Indio. Existe humanidade por trás da maldade do bandido. Ao mesmo tempo, existe um olhar perdido constante, como se ele não pertencesse à realidade e pensasse o tempo inteiro em como tirar vantagem de tudo e de todos.
Mais um dos grandes filmes de Leone. Conta com um dos duelos mais interessantes de um clímax de faroeste acompanhado da música La Resa Dei Conti, que é uma das mais inspiradas do mestre Morricone. Para entoar por horas e lembrar para sempre. Assim como quase tudo na trilogia da qual faz parte.
GERÔNIMOOOOOOOOO…