A condição humana implica um dilúvio de problemas. Nós somos bagunçados, pervertidos, corrompíveis; a bússola moral que nos guia é norteada conforme nossos interesses. Daí um figurão chamativo se materializa em nossas vidas e explica que as coisas não precisam ser necessariamente assim, que todo mundo é legal e qualquer joão-ninguém é belo por ser único. Essa é a mensagem de Doctor Who.
A longeva série de televisão completará 50 anos neste ano. Doze doutores já passaram pela série (sim, whovian, o John Hurt conta), exibida pela primeira vez em 23 de novembro de 1963, dia seguinte ao assassinato de John Kennedy. Desde o primeiro Doutor, a narrativa segue uma fórmula. Basicamente, o Doutor sempre será um eloquente penetra excêntrico que se intromete (ou tropeça) em situações que envolvem algum conflito com uma parte injustiçada. Lá pelas tantas a resolução do conflito bate em um beco sem saída. O Doutor, sempre genial, bola alguma solução criativa e impressiona quem quer que esteja lá para assistir.
Há outra constante nessa equação. Os companheiros do Doutor — mulheres, na maior parte do Tempo — são comumente britânicos de classe média que levam uma vida rotineira. Indo mais a fundo: são humanos. E, como demonstrou o Doutor em inúmeras ocasiões, os humanos têm o enorme potencial de alcançar a grandeza. Só precisamos de um empurrãozinho.
Tá, mas quem é esse cara e por que eu deveria me importar?
Não sabemos o nome do Doutor. Ninguém sabe. Bem, a esposa dele sabe, mas isso é uma longa história [spoilers! ;)]. Sabemos que ele é um Time Lord (Senhor do Tempo) de Gallifrey. Informação demais… espera, vamos por partes: ele é um maluco em uma caixa azul. Ok. Essa caixa azul, a TARDIS, dobra o tempo e o espaço sob os comandos do Doutor, e é tão inconspícua quanto um banheiro químico. Tem até o tamanho de um banheiro químico, mas mantém a aparência de uma cabine telefônica policial por fora. E, er, ela é maior por dentro. Grande mesmo. Tipo uma mansão conceitual planejada por algum carnavalesco durante uma viagem de LCD. Tá, resolvemos a parte da caixa.
O Doutor não é deste planeta. Ele vem de Gallifrey e lá os costumes são um pouco diferentes. Os Time Lords (nativos de Gallifrey… tá acompanhando?) têm o hábito de rebater a morte com regenerações. Sempre que o corpo do Doutor definha, ele se regenera e muda a aparência por completo. A personalidade também vai embora, abrindo espaço para as excentricidades do doutor seguinte. Entre um doutor e seu sucessor, só o que sobra é a memória. Finda a regeneração temos um sujeito completamente diferente, com um baú de particularidades a ser explorado.
O décimo-primeiro doutor (Matt Smith) protagonizará o especial de 50 anos da série, ao lado do décimo doutor (David Tennant) e do doutor café-com-leite (John Hurt), que não entrou na contagem por desonrar o título. Especula-se que ele tenha sido o responsável pelo exílio de seus conterrâneos da existência, uma vez que a guerra entre Time Lords e Daleks ameaçava toda forma de vida do Universo. No começo de agosto, foi anunciado que Peter Capaldi assumirá os comandos da TARDIS na pele do décimo-segundo doutor, que nos será apresentado no especial de natal deste ano.
Doctor Who é patrimônio cultural britânico. Douglas Adams e Neil Gaiman, escritores que merecem espaço aí na sua prateleira, escreveram alguns roteiros para a série. Um pedaço do léxico do programa foi adotado pelo Dicionário Oxford de Inglês, onde agora você pode encontrar os verbetes Dalek e TARDIS.
A série é produzida e veiculada pela BBC 1. A emissora é a mais antiga do mundo, e polariza a maior parte da audiência do Reino Unido. O orçamento da rede BBC vem de impostos pagos anualmente por cidadãos que assistem TV no país de Sua Majestade, a Rainha Elizabeth II (que já ocupava o trono por doze anos quando o Doctor Who foi transmitido pela primeira vez). Recentemente, o Príncipe Charles se declarou fã da série, e sustentou a declaração nos estúdios de gravação da BBC, em visita ao set da TARDIS.
Além da legião de fãs que a série cativou dentro de casa, Doctor Who ganhou espaço no mundo. O especial de 50 anos da série vai ao ar simultaneamente em 200 países. Até o dia 23 de novembro, o Velha Onda vai te manter a par de qualquer novidade.
VIDA LONGA AO REI!