Uma coisa um pouco incomum pode acontecer nos cinemas em breve. Se Relatos Selvagens se manter em cartaz até o dia 27, teremos dois filmes com o Ricardo Darín nos cinemas brasileiros ao mesmo tempo. A ironia fica ainda mais forte com o fato de que ambos filmes retratam atos de desespero de pessoas em situações que deveriam ser comuns e escalam para o horror total.
Sebastián (Darín) é um advogado de sucesso que precisa ir buscar os filhos na casa da ex-esposa, Delia (Rueda), para a escola antes de um dos julgamentos mais importantes da sua carreira. Ao sair do apartamento do sétimo andar com as crianças, elas apostam uma corrida com ele. Vão chegar ao térreo descendo as escadas correndo antes de Sebastián no elevador. Quando ele chega o térreo, porém, os meninos sumiram.
Sétimo é um filme de suspense rápido com um protagonista que se encontra em uma situação de desespero. Seguindo à risca a regra do Alfred Hitchcock, o filme encontra diferencial em como o conflito representa a situação atual de seu personagem principal. No caso de Sebastián, na perda do relacionamento com sua família.
Sebastián separado da família no enquadramento enquanto eles se despedem.
O roteiro segue a estrutura padrão de três atos com muita elegância. Apresenta todos os contextos que serão importantes para a trama rapidamente antes que Sebastián perca sinal dos filhos. Depois desenvolve o segundo ato com o personagem pensando em todas as possibilidades para o sumiço dentro do prédio. Conversa com todos os vizinhos, verifica a saída da garagem, repensa os suspeitos mais plausíveis. O terceiro ato depende de um conceito narrativo proposto por Hitchcock. O espectador sabe tudo o que está acontecendo em cena, mas os personagens não. Então o suspense é mantido em relação ao que vai acontecer, porque, como público, sabemos todos os riscos envolvidos, mas não as possíveis resoluções.
O diretor Patxi Amezcua, que também é roteirista do filme, brinca bem com a ideia ao permitir que o suspense se estenda ao máximo até que o clímax aconteça. Tirando essa sacada, ele usa do estilo comum do cinema argentino de acompanhar os movimentos dos personagens com as câmeras de forma a construir o ambiente espacial ao redor. Porém, quando as coisas começam a ficar mais tensas, não permite espaço nos enquadramentos para que os mesmo espaços sejam reconhecíveis. Isso se dá por conta da escolha de colocar câmeras tremidas e fechadas nos personagens para representar a tensão pela qual eles passam. Ele prefere transmitir o terror da situação a dar clareza do ambiente.
Após algum tempo de busca, a ex-mulher volta à cena para ajudar a procurar os meninos. Quando as opções começam a esvair, os dois entram em um complicado diálogo acerca do relacionamento rompido. É quando o filme revela qual a sua proposta principal. Sebastián é um calhorda. Ele vive de proteger criminosos, está ciente de diversos atos de corrupção ao seu redor (provavelmente participa de vários) e não só traiu a esposa, como o fez por um ano com a melhor amiga dela. Ele é uma dessas péssimas pessoas comuns que todos conhecem em suas rotinas, mas não é um monstro capaz de separar alguém de seus filhos. Essa reflexão é importante para o final e para a resolução do relacionamento entre Sebastián e Delia.
Delia e Sebastián. União que vem do sofrimento comum.
A união de Ricardo Darín com Belén Rueda é uma chance de ouro de ver dois dos maiores intérpretes da língua espanhola atuando juntos. Ela vem da Espanha e ele da Argentina. E o filme aproveita para brincar com a dualidade das nações, fazendo com que Delia queira voltar para a Espanha com os filhos e Sebastián queira que eles fiquem em Buenos Aires.
Sétimo não é apenas mais um filme de suspense rápido. Também faz uma reflexão interessante acerca de valores familiares em um casamento falido e vai além ao fazer com que o enredo policial se desenrole ao redor dos conflitos pessoais. Para deixar o titio Hitchcock orgulhoso.
FANTASTIC…