Eis um caso curioso: a Netflix compra os direito de distribuição de um filme independente exibido no festival de Sundance. O material de baixo orçamento provavelmente consegue mais visibilidade no lançamento em streamming do que se tivesse sido comprado por uma distribuidora comum. Assim, The Fundamentals of Caring (o nome em português está apenas no IMDB) chamou a atenção de muita gente.
Trata-se de adaptação do livro The Revised Fundamentals of Caregiving, na qual o personagem Ben Benjamin (Paul Rudd), um homem solitário na casa dos 40 anos, começa a trabalhar como cuidador de pessoas com deficiência. O primeiro trabalho dele é o jovem Trevor (Craig Roberts), um adolescente com uma doença que inibe o desenvolvimento muscular. Com o convívio, Ben descobre que Trevor gosta de saber sobre passeios turísticos peculiares dos Estados Unidos, como o maior boi do mundo. Então convence Trevor e a mãe a deixá-lo levar o garoto em uma viagem de carro até o maior poço do país.
A proposta é básica e comum: pessoas se unem em uma situação nova para elas e as interações ajudam a resolver os problemas de cada um. Durante o caminho, dão carona para a garota Dot (Selena Gomez), que foge de casa, e para a grávida Peaches (Megan Ferguson). Os conflitos dos quatro envolvem, indiretamente, a discussão principal do filme: paternidade e a falta de uma figura que a represente.
A proposta é boa, simples e repetida. Fica óbvio que Ben vai ser uma espécie de pai para Trevor enquanto o garoto será uma espécie de substituto para uma criança. Daí, fica fácil prever algo que o filme trata como um grande mistério. O roteiro de The Fundamentals of Caring peca exatamente em ser básico demais. Se não fosse a necessidade de criar pequenos mistérios, a trama dramática funcionaria muito bem. Principalmente porque o filme zomba do fato de que seria facilmente um melodrama. Basta colocar um garoto com deficiência e com problemas paternos e você tem uma novela.
Aí entra o acerto do roteiro do filme. Assim como Trevor é sarcástico para lidar com a própria dor, o texto ironiza a necessidade de sentir pena dele. Ele sofre, tem uma condição complicadíssima e tudo o mais. Mas ele ainda é capaz de sorrir e zombar do mundo. Especialmente porque ele se sente quebrado no mundo, mas não é “digno de pena”. Isso é importante também para que Ben se torne um personagem simpático, por ter que interagir com essa pessoa.
É claro que ter um Paul Rudd como intérprete ajuda muito. O ator tem uma capacidade impressionante de despertar empatia sem sorrir ou tentar ser engraçado. A personalidade dele é outra: trágica. Impossível não se identificar com os olhares melancólicos de Rudd. O que é perfeito para um quase melodrama deste naipe. Craig Roberts tem que fazer algo parecido, mas com um tanto de desafio típico da adolescência. Ele é eficiente e consegue despertar um leve desespero com o perigo de como o personagem é imprevisível. Até a Selena Gomez está bem como uma máquina de disparar palavrão porque tem muita mágoa.
Rob Burnett é o diretor e o roteirista do filme. Ele é eficiente em contar a história, mas não acrescenta muita personalidade pela direção. O valor dele é o texto, com os diálogos bem escritos e sem necessidade de explicar as coisas por meio de narração. A direção dele é como o filme em si. Interessante, com muita qualidade, mas com falta de algo que o faça ser um verdadeiro deleite.
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