Dick Cheney (interpretado por Christian Bale) foi um assessor e estrategista político muito influente na política norte-americana que começou seu legado nesse cenário na década de 1960 e conseguiu se manter nesta esfera até o começo do governo de George W. Bush (Sam Rockwell), em que se tornou vice-presidente na chapa eleita, e continuou seu legado até o fim do mandato, em 2009.
Dick se aproximou do Partido Republicano desde um curso sobre política que havia feito no congresso americano para fugir de uma vida de confusões, brigas e alcoolismo no interior conservador dos Estados Unidos da América.
Um aspecto que já podemos destacar da narrativa do longa é justamente a capacidade do roteiro de apresentar o personagem novo, com seus problemas pessoais antes da política e, em um curto período de tempo, já o inserir neste cenário. Sem danos à construção da personalidade e da atmosfera existente ao redor do protagonista e sua família.
A proposta do filme, dirigido por Adam McKay, é contar a história de vida e do pensamento político por trás de Dick. Elementos que possam explicar decisões polêmicas que ele sempre tomou enquanto esteve no poder de vice-presidente. Não é, necessariamente, narrar trajetórias históricas dos EUA perante o mundo, principalmente as que não tiveram certa influência de Dick.
A todo instante, percebe-se um conflito social presente no discurso da obra entre conservadorismo e progressismo. Os dois dentro da lógica liberal se pensarmos em economia no quesito de intervenção estatal em território nacional. A rixa, de fato, é abordada no ramo dos costumes.
E seria impossível assistir ao filme e não se pensar no cenário atual de política brasileira desde o período das eleições de 2018. Tamanha são as manobras para se chegar ao poder, e existe uma facilidade em convencer o público.
O filme mostra isso, como as pessoas estão dispostas a ouvir ou dar prioridade a discursos que só reforçam os próprios pensamentos. E, principalmente, como um político consegue ser apenas a personificação do grande desejo individual do ser humano, o poder sobre tudo e todos. Há momentos que as pessoas nem sabem o que querem, ou o que fariam, até possuírem o poder, de fato.
Como vice-presidente dos EUA, Cheney governou muito mais que o próprio presidente George W. Bush. Estava no tratado deles quando nosso protagonista foi cortejado para fazer parte da chapa. Existe uma pergunta ao final que pretende excluir a obra de um certo partidarismo, mas não se engane. É nitidamente partidário.
Amy Adams está magnífica no papel de esposa de Dick. Ela passa um tom de poderosa, nitidamente exerce uma influência grande sobre o marido e, em alguns momentos, nos faz crer que também teria tanta culpa quanto ele em relação as decisões polêmicas. Vale destacar que isso se evidencia, principalmente, nas abordagens sobre o casamento gay.
É bacana ressaltar o trabalho da direção na tentativa de mostrar duas realidades, uma verdadeira e a outra que poderia ter sido. Não só nessa disposição, a forma como é cortada do universo político para o pessoal do personagem também funciona de forma dinâmica.
Na primeira vez em que se depara com a transição entre realidades distintas, pode-se ocorrer um certo estranhamento, mas logo o espectador percebe que será algo corriqueiro ali e se acostuma fácil. Isso dá certo pela dinâmica na transição, por sair de um ponto de clímax de uma realidade para ir para outro ponto de clímax em outra e pela pitada cômica que existe em dois momentos no longa.
Vice é um filme para um público específico. Quem já é fã do gênero vai se sentir extremamente satisfeito. Em termos narrativos, é menos complexo que A Grande Aposta, por exemplo. Entrega o que promete e ainda nos leva à reflexão, independente do país em que nos encontremos.