Miséria pouca é bobagem. A frase nunca foi tão apropriada quanto no caso dos personagens de A Roda. Melodrama por si só não é determinante de filmes ruim, mas neste caso a tragédia vai a tantos extremos que o filme inteiro daria sozinho uma novela televisiva.
Sisif (uma referência direta ao mito de Sísifo) é um engenheiro de trens brilhante que salva uma menina orfã depois de um acidente. Preocupado com a criança, a leva para criar como irmã do filho único, chamado Elie, da mesma idade. Ele cria os dois sozinho, a esposa morreu no parto do menino, e a batiza de Norma. Com o passar dos anos, Norma e Elie se tornaram adultos. Sisif, porém, vive em desgraça ao perceber que está apaixonado pela mulher que a garota virou e que sente ciúmes da relação que ela desenvolveu com Elie. Os dois não sabem que não são irmãos e criaram uma grande intimidade entre si.
Só por isso já seria um melodrama gigante, mas reviravoltas continuam a ocorrer e o sofrimento do trio nunca acaba. O exagero dessas reviravoltas resulta em uma trama que prende a atenção. É impossível não se perguntar o que diabos vai ser daqueles três desgraçados. Essa atenção, no entanto, não é completamente positiva.
O roteiro nunca dá descanso para a tristeza e não recompensa nem os personagens ou os espectadores. É tanta tragédia que as reviravoltas param de chocar. A cada desgraça nova o filme fica mais ridículo. Se houvesse algum descanso nessa mistura, os males que se abatem sobre eles seriam mais incômodos. Por outro lado, esse ridículo fica divertido. É engraçadíssimo pensar em qual vai ser o próximo grande problema que irá colocá-los para baixo.
Tudo isso não seria muito pesado no ritmo se o filme não tivesse quatro horas e vinte de duração. É comprido pra caramba e muitas cenas são mais extensas do que precisam ser. Para piorar, a obra ficou perdida com o passar dos anos desde o lançamento original e foi reencontrada aos pedaços. Eles foram reunidos nesta edição sem perder a lógica da história. Com todo o material original, a duração era de nove horas. Se, com quatro horas, o filme já é cansativo, com mais cinco deve ser muitíssimo chato.
Tendo dito isso, ele entrou na lista dos 1001 filmes por algum motivo. E o fato é que eles tiveram um motivo ótimo. A Roda abre com uma cena impressionante, para o ano de 1923, de um acidente de trem. Tudo realizado com montagem acelerada e repleta de cortes. Esse domínio técnico se apresenta pelo resto da produção. Para não ter que explicar as dores emocionais dos personagens, a edição sobrepõe imagens. Em uma belíssima cena, Elie, apaixonado pela irmã, a vê pela janela no lugar da linda paisagem. Ele é incapaz de usufruir da beleza da vida por causa do trauma. Melhor ainda é como coloca uma roda de trem que gira ao redor de Sisif sempre que este sofre. Essa sobreposição aumenta mais a relação do personagem com o mito grego.
Caso se sinta com vontade de encarar esse monstro e acompanhar os tormentos dos três, dê o play abaixo. [youtube=https://www.youtube.com/watch?v=SmQj9fETRN8]
FANTASTIC…
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