Ficou difícil encaixar Aliados em uma categoria cinematográfica só. Drama, suspense, romance, filme histórico, qualquer um desses gêneros pode facilmente ser usado para descrevê-lo, mas isso é só parte da equação.
Aliados se passa em meio ao estopim da Segunda Guerra Mundial, em plena Europa ocupada pelos nazistas. Max Vatan (Brad Pitt) e Marianne Beausejour (Marion Cotillard) são espiões em missão no Marrocos, e devem se passar por um casal apaixonado para assassinar um embaixador nazista. Mas enquanto cumprem seus papeis se apaixonam de verdade, decidem se casar e, logo em seguida, se voluntariar para trabalhar de forma mais segura em Londres. A vida corre bem, tão bem quanto um ambiente de guerra pode permitir, e um ano se passa até que Max recebe de seus superiores a notícia de que sua esposa está sendo investigada por ser uma possível espiã para os alemães, e agora ele deve procurar responder perguntas sobre o passado de Marianne para provar sua inocência, ou não.
O conflito entre o casal central é o foco da trama, ainda que os horrores da guerra e o trabalho de espionagem internacional sejam a moldura para a história de amor. Dois espiões com passados confusos e inexplorados, diálogos que persistem em não aprofundar nenhum aspecto da vida pessoal de ambos, e muito desenvolvimento em cima do início do relacionamento garantem o clima tenso durante toda a trama. O espectador não se sente confortável para confiar em nenhuma informação que ouve, e em nenhum gesto que presencia. Somos instigados a desconfiar, junto com os personagens centrais, de tudo e de todos, fazendo com que a ambientação e o clima de espionagem seja latente durante o segundo e, principalmente, o terceiro ato, onde se concluem todos os mistérios e dúvidas.
Como mencionado, o início do filme se garante em desenvolver dois aspectos de forma mais profunda. A construção da relação entre os protagonistas, e o contexto histórico. Não há explicações nem personagens famosos da história, mas temos pleno entendimento, desde o início, do clima da cidade, Casablanca, das festas onde a felicidade é sufocante, dos oficiais em uniforme que se cruzam e se examinam a cada olhar, das amizades falsas e da presente necessidade de manter-se nas graças dos opressores nazistas.
Até ai o filme mantém a intriga e o clima de tensão com maestria, mas tão logo a passagem de tempo acontece e há uma certa sensação de segurança, acontece também uma mudança na profundidade dos sentimentos que os personagens carregam, e infelizmente Brad Pitt – O Curioso Caso De Benjamin Button (2008) – decepciona. Ator consagrado e de grande talento, ele parece ter tomado a decisão consciente de que Max não se permitiria reagir de forma extrema em nenhuma circunstância, mesmo quando está em uma busca frenética pela verdade sobre sua esposa com quem está casado a um ano e com quem tem uma filha. Aparte da cena em que é informado por seus superiores sobre a situação de sua família, ele não parece mais reagir como um homem num drama romântico reagiria. Talvez seja uma questão de gosto pessoal, mas sinto que a dramaticidade traria muito mais realismo ao personagem, e que talvez outro ator mais dramático entregaria de forma mais convincente a realidade de um homem que muito possivelmente terá que assassinar a própria esposa.
Marion Cotillard – Piaf – Um Hino Ao Amor (2007) – por outro lado, entrega uma performance contínua e agradável por todo o longa. Seu desenvolvimento emocional é visível, mas a personalidade de Marianne se mantém firme e constante, nos mostrando a cada momento e diálogo um pouco mais de sua construção detalhada, suave, delicada.
Os personagens secundários, como Bridget (Lizzy Caplan) e Frank Heslop (Jared Harris), tem aparições rápidas e servem apenas para costurar a história.
A maior estrela do filme está, porém, por detrás das câmeras. O diretor Robert Zemeckis iniciou sua carreira com filmes de comédia pastelão feitos para divertir acima de tudo, como Uma Cilada Para Roger Rabbit (1988) e De Volta Para O Futuro (1985), desenvolveu-se mais tarde para filmes mais reflexivos como Forrest Gump (1994) e Náufrago (2000), e agora possui muitos fãs entre o grande público por saber costurar boas tramas em meio a efeitos especiais e cenas grandiosas. Ele dirige Aliados com tranquilidade, entregando o enredo e seus personagens em ritmo desacelerado, sem pressa de entregar o jogo e sem perder a finesse dos diálogos ou cenas de ação. E para o entendedor geral de filmes de guerra, a ambientação da Europa dos anos 1940 é impecável.
Aliados entrega um bom filme de espionagem, que deixa o romance e o drama humano dominarem na medida certa as cenas que pediam pela mudança momentânea de foco, e no final das contas entretêm e garante uma boa sessão de cinema, com pegada mais leve e acessível, para agradar um público maior, muito além dos fãs do gênero(s).