O plano sequência que abre o filme Samba apresenta de forma inteligente o que é o grande trunfo da produção. Em um grande casamento, os noivos dançam junto com convidados o estilo que dá nome para o filme enquanto cortam o bolo. A câmera vai daí através da festa, entra na cozinha e encontra o staff que trabalha por trás com menos glamour. Passa pelos chefs e garçons e encontra os lavadores de prato. Principalmente o protagonista, que também se chama Samba. Eis aí o apelo maior do que se verá pelos próximos minutos: Omar Sy.
Samba (Omar Sy) é um imigrante senegalês que vive ilegalmente em Paris. Descoberto, ele vai preso e recebe ajuda legal de uma ONG. A voluntária de primeira viagem, Alice (Charlotte Gainsbourg), é uma das pessoas mandada para o caso dele. Imediatamente surge uma forte atração entre os dois, mas a ética e os problemas de cada os impedem de ficar juntos. A história deixa claro que é um romance, mas, como nos melhores casos da França, sem o clichê de duas pessoas que precisam se unir para que o mundo esteja correto.
O que é bom. É justamente o romance dos dois o maior defeito do filme. Existe uma química, mas ela se dá porque fica a impressão de que existe realmente uma grande atração mútua. Amor, por outro lado, não parece existir ali. Isso se dá por duas razões. Primeiro porque a personagem dela não é coerente. Existe um excesso de vulnerabilidade que não condiz com as coisas que ela diz e faz. Alice é uma executiva de sucesso que teve um colapso mental. Parte do tratamento é fazer o serviço voluntário. Ela diz que tem anos que não sorri e só pensa em números e lucro. O tipo de trabalho exige uma dureza que ela não possui. E ela infelizmente se resume a isso, sem profundidade. Apenas atração por um homem e olhares frágeis.
Gainsbourg com papel fraco. Reduzida a mocinha romântica.
Sem contar que, em comparação com os dramas individuais dele, ela perde a empatia. O Omar Sy não é apenas mais simpático, como a trajetória dele para conseguir se sustentar na França sem ser deportado é envolvente. É injusto, perigoso, relaciona questões de vida ou morte e pode, a qualquer momento, fazer com que ele e a família percam tudo. Não bastasse isso, ele enxerga todas as dificuldades e oportunidades com graça e charme. Mesmo quando está com raiva, os problemas dele são compreensíveis. Não são gritos fora de lugar ou de contexto. O roteiro sabe que o foco da história deve ser ele, e não ela. Por isso dá destaque para os momentos dramáticos de Omar Sy, enquanto Charlotte Gainsbourg aparece pouco.
Outro grande acerto do roteiro é retratar a história com a mesma leveza que Samba carrega na vida. Em uma das cenas mais divertidas, Samba foge com um amigo da polícia através de um telhado. O protagonista tem medo de altura e as agruras dos dois para se locomover geram momentos hilários. O perigo não é o suficiente para que o filme se perca na tensão. A intenção dos diretores Olivier Nakache e Eric Toledano (os mesmos de Intocáveis, que revelou Sy para o mundo) não é fazer um suspense, mas um drama cômico. O uso dessas brincadeiras é importante para manter o tom que conduz a trama. A dupla sabe fazer com que as cenas sejam dinâmicas e focam nos personagens nos momentos certos durante os diálogos. Importante porque o filme é praticamente contado através dos diálogos e das pequenas movimentações dos atores durante os mesmos.
No final, Samba se sustenta pelo ótimo drama do personagem título. A contraparte romântica mais atrapalha e o romance dos dois não convence. Sem essa trama, o filme seria mais enxuto e com ritmo melhor. Ainda assim, é divertido e cativante. Faz rir com a comédia e emociona com o protagonista. Os diretores contam bem a história, mesmo que não sejam inventivos. A tríade de ouro, bom texto, falado por bons atores e bem dirigido.
GERÔNIMOOOOOOOO…
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