Depois de mais de trinta anos da franquia Star Wars, o universo estendido finalmente ganhou os cinemas. Sem enfoque nas aventuras da família Skywalker ou sobre os caminhos da força, Rogue One segue algo novo para a cinessérie: as pessoas que não são heróis. Ou talvez seja sobre aqueles heróis que não se tornam conhecidos.
Para fazer isso, a história segue Jyn Erso (Felicity Jones), a filha de um engenheiro que trabalhou em uma arma bélica para o império que comanda a galáxia. Com rancor tanto do governo quanto dos rebeldes, ela aceita fazer uma missão pequena para o segundo grupo em troca de liberdade jurídica. Nisso, descobre que tem a chave para impedir destruição em massa e impedir a morte de muitas pessoas.
Como se trata do primeiro filme fora da numerologia oficial de Star Wars, Rogue One tem duas funções primárias. Primeiro, deve agradar os fãs da franquia; e segundo, deve ser um bom filme por si só. Em outras palavras, tem que ser Star Wars, mas tem que ser um filme individual.
E é justamente o que o filme faz. A franquia segue um padrão de histórias de heróis maiores que a vida que surgem de lugares comuns. Aqui, porém, a proposta é acompanhar pessoas que foram para lugares sombrios durante a vida e precisam se apegar à esperança. Isso é visível em Jyn, que é uma criminosa que vive sem amarras na vida. Mas também é possível notar em todos os outros coadjuvantes.
Cassian Andor (Diego Luna) é um rebelde que teve de fazer coisas horríveis na vida em nome do que é “certo”. O robô K-2SO (Alan Tudyk) era do império e foi reprogramado. Bhodi Rook (Riz Ahmed) era um piloto do governo que busca reparação pelas maldades das quais fez parte. Galen (Mads Mikkelsen), o pai de Jyn, teve de sacrificar a paz pessoal e, em grande parte, os próprios ideais para salvar a vida da filha. Saw Gerrera (Forest Whitaker) entrou em uma espiral de desespero e paranoia devido à guerra.
Guerra, diga-se de passagem, talvez seja a palavra principal. Os personagens e os temas do filme tratam de questões muito profundas sobre o tema. Quanto se é herói ou vilão quando sua vida e missão é ser um assassino? Em um conflito de larga escala, é correto buscar vingança ou justiça pessoal, uma vez que os envolvidos têm influência na vida de milhões de pessoas?
É onde entra o talento dos roteiristas, Chris Weitz e Tony Gilroy, em equilibrar os temas em uma narrativa coesa. Eles não seguem o caminha normal para esse tipo de produção. Não há cena de apresentação para os personagens, que têm as personalidades apresentadas enquanto a trama se desenrola. Compreende-se os conflitos e características com base no que fazem em cada momento do enredo.
Um dos mais interessantes nesse sentido é Cassian, que mata um aliado quando vê que será necessário para escapar de uma situação perigosa. Mais tarde, quando é mandado matar outro alguém, é possível ver no receio dele que é algo que o fere. Não é preciso um discurso preguiçoso que os explique.
O diretor Gareth Edwards busca dar ambientação cuidadosa para cada cena, uma característica comum a toda a carreira dele. Ele se preocupa em fazer com que a iluminação e a arte construam o mundo, e, portanto, procura usar os cenários e enquadramentos diferentes para dar a sensação de cada local, das roupas, das maquiagens, dos objetos. O que também indica qualidade por parte de Greig Frase, o diretor de fotografia, e da dupla Doug Chiang e Neil Lamont, os designers de produção. Existe uma perfeição técnica em Rogue One que impressiona. As imagens são belas, bem filmadas e enchem a tela com cenas bem feitas.
Por outro lado, Edwards tem problemas sério em lidar com montagem. No começo do filme, faz cortes muito acelerados entre as cenas, e não funciona. É corrido demais e causa confusão. Em uma trama paralela, acompanha-se Jyn na prisão. Em outra, Bhodi tenta entregar uma mensagem para um grupo de rebeldes. Em mais uma, Cassian busca pistas sobre os outros dois. Como a montagem é rápida, é fácil ficar perdido entre as tramas e não se envolver realmente com os personagens.
Apenas no segundo ato, quando eles se unem e a história começa a desenrolar de verdade, é que o filme encontra o ritmo certo. E isso ocorre com cerca de quarenta minutos. Ainda assim, Edwards sabe fazer um terceiro ato que é, ao mesmo tempo, climático em termos de ação e de desenvolvimento de personagens. O que leva a um final ideal para este filme.
A música de Michael Giacchino, apesar de eficiente, é muito problemática. Ele tenta se manter na ambientação comum a Star Wars sem seguir os temas exatamente como nos outros filmes. É possível sentir que os instrumentos de sopro e de cordas são usados como o John Williams o fazia nos sete episódios, só que existe uma individualidade. Mas a trilha não tem força e, em diversos momentos, parece que as notas não se adequam e causam um incômodo.
Com a exceção de Felicity Jones, todos os atores estão ótimos. Ela, infelizmente, se atém à inexpressividade padrão e, até nos momentos mais dramáticos (em especial uma parte com choro na chuva), ela não parece estar totalmente presente em cena. Nos poucos minutos que compartilha com Mikkelsen, ela é devorada pela presença do ator, que consegue dizer muito com poucas variações no rosto. As outras interpretações possuem uma carga sentimental cuidadosa na tragédia de pessoas que passaram a vida inteira na guerra. Também merece destaque o vilão Orson Krennic (Ben Mendelsohn), que não é poderoso, mas apenas patético e digno de pena. O que é ótimo e resulta em uma performance muito rica.
Rogue One faz algo muito certeiro. Ele não é Star Wars, mas é ao mesmo tempo. Abre espaço para que outros realizadores contem histórias com contextos, discussões e mensagens diferentes dentro daquele universo que sempre tratou dos mesmos temas. Ele enriquece a franquia e respeita o que já existe. Além disso, é um ótimo filme sobre as consequências da guerra na vida das pessoas.
P.S.: O elenco da equipe de protagonistas é formado por uma mulher, um mexicano, dois asiáticos e um médio oriental. Só por isso, já merece destaque entre a maioria dos filmes comerciais usuais.
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